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Assins & Assados

Assins & Assados

04
Mai25

A Cavala Algarvia e as associações improváveis que despoletou.

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O objetivo era um jantar rápido e leve antes de ir para casa. Estava na altura pelo Saldanha e decidi ir ao Lota Sea & Fire.  Para entrada pedi uma Cavala Algarvia. Chegou-me um prato com cavala, a polpa interior de tomate e uma água de tomate, para além de outros temperos. Enquanto comia, com muito agrado, fui fazendo várias associações à primeira vista improváveis... associei-o à minha Mãe (que nunca fez um prato assim, nem me lembro de ter cozinhado cavala) e ao Heston Blumenthal, onde comi cavala num prato diferente, de facto um dos pratos que considero dos melhores que comi na minha vida - o Sardine on Toast Sorbet. Mas a cavala também não era particularmente importante nestas associações. De facto, o importante era a polpa e a água do tomate.

Lembro-me de fazer Doce de Tomate com a minha Mãe, e é bom lembrá-lo hoje que é Dia da Mãe. Na época do tomate havia sempre um dia em que se faziam alguns tacho de doce de tomate para o ano inteiro. A receita era esta:

 

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Cortávamos uma cruz superficial nos tomates, colocávamo-los um ou dois minutos em água muito quente, e a pele saía facilmente. Depois, abríamos os tomates ao meio e tirávamos toda a polpa interior. Era esta a parte que mais me intrigava. Havia um passador de rede por cima de uma tigela e a minha Mãe dizia-me para tirar a polpa interior e todas as sementes com uma colher de chá e deitar tudo para o passador. A ideia era que as sementes ficassem no passador e o resto da polpa passasse para a tigela. Quando lhe perguntei um dia porque fazia aquilo ela respondeu-me que aquele líquido era a parte mais saborosa do tomate. Nunca mais me esqueci desta resposta.

Uns anos depois soube que o Heston Blumenthal tinha comentado com uns químicos da Universidade de Reading no Reino Unido que a polpa interior do tomate, à volta das sementes, era muito mais saborosa que a parte restante mais firme e carnuda, que se sentia mais o gosto umami.  Ficaram curiosos, foram pesquisar a literatura, e verificaram que não havia registos de comparações do sabor de componentes de diferentes partes do fruto do tomate, nem da análises do teor de compostos umami entre diferentes variedades de tomates. Ficaram interessados em investigar este assunto e publicaram posteriormente os resultados.

 

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Usaram um painel de provadores para provar a polpa interior do tomate e a parte mais firme. No entanto, para não haver influências da textura ou do aspeto, separaram a duas parte do tomate, meteram num liquidificador e a seguir filtraram para obter uma água de tomate em ambos os casos. Foi essa água que foi provada e as conclusões foram as da tabela seguinte:

 

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Ou seja, a polpa interior e a parte mais firme do tomate foram percebidos de forma diferente. A polpa foi considerada  mais salgada, com maior teor de umami, e mais ácida. A percepção residual destes gostos também seguia a mesma linha.  As sensações na boca  (um formigueiro, adstringência e viscosidade) também foram sempre superiores para a polpa.

Análises do teor de sal e do pH mostraram valores idênticos (de facto menos sal na polpa interior), que não explicam a diferença sentida pelos provadores. Onde havia grandes diferenças era no teor de compostos responsáveis pelo gosto umami. Os valores para o ácido glutâmico (Glu) e para o monofosfato de adenosina (AMP) eram diferentes nas 14 variedades de tomate analisadas. Contudo, eram sempre muito mais elevados na polpa interior do que na parte firme do tomate. Para o Glu a média era  de 4,56 para a polpa interior e 1,26 g/kg para o resto do tomate. Para  a AMP os valores na polpa variaram entre 213 e 561 mg/kg e na parte mais firme entre 24 e 196 mg/kg. Estes valores explicam a diferente perceção do gosto umami,  e podem também ser uma explicação para a diferença da perceção do teor de sal e acidez, pois os compostos responsáveis pelo gosto umami intensificam a perceção dos sabores.

Quando li tudo isto há uns anos lembrei-me do doce de tomate da minha Mãe e do que me disse, estes estudos demonstravam que ela tinha razão. Também a partir daí sugeri frequentemente aos meus alunos que pusessem um tomate cereja na boca e o apertassem com a língua de forma a sair a polpa interior e sentissem o sabor. E que depois disso mastigassem o resto do tomate e vissem a diferença.

Voltando ao prato que despoletou todas estas memórias e reflexões, e me levou a fazer estas associação à primeira vista improváveis, mas que tinham a sua razão de ser. Os peixes de mar e os mariscos têm normalmente um teor de umami elevado, tal tem como função não os deixar desidratar na água salgada, como já referi num outro post. A cavala é um peixe com um elevado teor de umami, este complementado pelo umami do tomate, tornava o  prato delicioso e irresistível. 

 

 

17
Abr25

SÁLA de João Sá e a sua cozinha única que reflete identidade e local

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Há muito que queria voltar ao Sála do João Sá. Fui lá algumas vezes na altura em que abriu, mas estive uns anos sem voltar. Tentei marcar umas vezes, mas com pouca antecedência, e nunca consegui. Finalmente planeei bem as coisas e num sábado recente almocei na primeira mesa que se vê na foto acima.

O mesmo espaço simples, mas acolhedor e elegante, com detalhes que lhe dão personalidade, com a cozinha à vista e a porta diretamente para a rua. Contudo, a comida oferecida mudou muito. Apesar de em visitas anteriores ter gostado bastante, o nível da cozinha do João Sá agora é outro, reflete uma maior maturidade, que justifica a estrela Michelin atribuída ao restaurante há cerca de um ano. Optei pelo menu "À procura de nova texturas" um menu que o João Sá diz traduzir a sua visão de Lisboa, que considera ter uma culinária vibrante resultante da influência das viagens, de que era ponto de partido e chegada, e de quem chegou vindo de outras paragens. Assim, todos os sabores do mundo que confluíram em Lisboa, bem como a ligação de Portugal com o mar, e em particular o Oceano Atlântico, influenciaram este menu.

Ao chegar serviram-me um caldo, inspirado no caldo verde. Se visualmente não era possível relacioná-los, o sabor denunciava a fonte de inspiração. Um sabor conforto que preparava para a aventura que se seguiu.

 

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Caldo verde, Óleo de Algas, Pimentão Fumado

 

Foi então servida uma sequência de pequenos pratos caracterizados por uma apresentação muito cuidada, sabores fortes, texturas variadas e muito bem trabalhadas.

 

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Berbigão na Caruma

 

Gosto muito de berbigão, este tinha um sabor levemente fumado, e o caviar contribuía com uma componente salgada, um reforço do umami, e o seu sabor complexo, que elevavam o berbigão para outro nível.

No início serviram-me um Champagne, mas os pratos seguintes foram acompanhados por vinho branco, o Insula - Arinto dos Açores, 2018.

Trouxeram em seguida uma misteriosa caixa com o logo do restaurante. Lá dentro um pequeno snack, uma muamba de galinha servida entre duas folhas crocantes de pele de galinha desidratada.

 

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Muamba de Galinha

 

A gamba que se seguiu era lindíssima, visualmente e em termos de sabor, sendo servida entre duas placas crocantes, cujo formato lembrava algas, mas com um sabor a pimentão.

 

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Moqueca de Gamba

 

O mar também estava presente no prato seguinte.

 

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Ostra, Caldo de Cebola, Gotas de Cavala

 

Esta sequência de pratos foi interrompida por um momento mais terra a terra e com características bem diferentes. Um corte bem vindo, que preparou os sentidos para poder desfrutar bem da complexidade de todo o resto do menu.

 

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Pão,  Manteiga Caramelizada, Azeite Metáfora de Trás-os-Montes.

 

Seguiram-se dois pratos de marisco deliciosos. Um primeiro refletia influências de sabor de outras paragens, sendo o umami da santola complementado e intensificado com o das ovas. No segundo, o sabor do marisco era complementado com notas doces do caramelo e da castanha.

 

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Santola, Caril Goês, Harissa

 

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Lavagante, Caramelo, Castanha

 

Depois de tanto "mar" chegou a altura da "terra", num prato delicioso de cogumelos. Curiosamente um ingrediente também com alto teor de umami. Em japonês a palavra umami significa delícia. E por muitas e variadas razões estes pratos eram deliciosos.

 

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Fricassé de Cogumelos, Morilles, Trufa Preta 

 

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Cuscos, Coentrada, Bivalves

 

O prato de cuscos é visualmente muito impactante. Tanto que é um dos pratos referidos no texto que surge no Guia Michelin sobre o Sála. Referem-no como sendo um prato tecnicamente simples, mas tremendamente visual e saboroso que os encantou pela sua forma de combinar os cuscos, que ficam completamente verdes, com o mar. A mim também me encantou.

Com os pratos seguintes bebi um vinho do Douro, o Indie Xisto tinto, 2021. Com ele chegou um prato mais arriscado, uma caldeirada de enguias. Gostei muito! O sabor da caldeirada é um sabor muito nosso.

 

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Enguia, Caldeirada, Alho Negro

 

Era possível vir um prato ainda mais delicioso? Ele aí estava, imponente e um luxo!

 

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Robalo, Espargos Verdes, Caviar

 

O último prato salgado era visualmente mais estranho e difícil de identificar. Mas o sabor denunciava-o, era um arroz de polvo com algas.

 

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Polvo, Algas, Arroz

 

Tinha chegado a hora das sobremesas. Na primeira, um gelado com um ingrediente pouco comum, a calabaceira, também conhecida por baobá. Um ingrediente que, tal como outros sabores em pratos anteriores, reflete as origens angolanas do João Sá e as suas memórias de sabores. Acompanhava-o um pequeno recipiente com pedaços da polpa da calabaceira, para nos podermos familiarizar com ela se assim o desejássemos.

 

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Calabaceira | Mangericão |Lima

 

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Tomilho | Azeite | Brioche

 

Com o chá chegaram alguns petit fours, mas o serviço estava a terminar e o João Sá veio à mesa e ficámos a conversar algum tempo. Nem me lembrei da foto. Mas valeu a pena, é que a conversa foi quase tão boa como o almoço.

Impressionante o funcionamento da cozinha mesmo ali ao lado, tudo corre de forma calma e eficiente. Um bom serviço de sala é fundamental para uma boa experiência, e o do Sála foi muito bom e muito simpático.

A cozinha do João Sá evoluiu muito, sente-se uma grande maturidade. Reflete muito as suas memórias de sabores, e as nossas também, e gostei muito disso. A comida é central para a identidade, individual e do grupo, e é interessante pensar no que define as características de uma cozinha de um dado país / cultura. É um assunto complexo! Não é necessariamente a componente visual, nem os ingredientes, embora estes possam também ser importantes. Mas há notas de sabor que funcionam como marcadores, referidas num artigo de Claude Fischer, de que falei num outro post, como "princípios do sabor", e que são complexos olfativos e gustativos típicos de uma determinada culinária. É sobretudo isso que na cozinha do João Sá define a identidade e o local, uma cozinha que só pode estar ali, que é única.  

 

SÁLA - Rua dos Bacalhoeiros, 103 - Lisboa

 

1ª foto do site do restaurante

24
Mar25

Marmalade, um doce (para adultos) de que tem que se aprender a gostar

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Quando me perguntam se com a torrada que pedi para o pequeno almoço quero "jam or marmalade?", em geral peço marmalade, porque em Roma se deve ser romano... Mas há dias em que para amargo já basta o de alguns acontecimentos que não podemos controlar, nesses dias preciso de algo mais suave, e fico-me por um doce de morango ou framboesa.

A palavra marmalade, lembra a nossa marmelada, e o que tenho lido é mais ou menos unânime atribuindo a esta a origem da palavra inglesa. No entanto, são bem diferentes, a marmelada é um delicioso doce sólido de marmelo, a marmalade é um doce de laranja amarga, tipo geleia espessa mas, em geral, com pedaços de casca da laranja em suspensão. Será também delicioso para alguns mas, talvez por não ser da minha criação, ainda estou a aprender a achá-lo delicioso. Para já é uma experiência interessante, é exótico, e algo que me apetece entender e descobrir melhor.

Mas voltando ao nome, dizem que há registos, do final do século XV, da chegada a Inglaterra e à Escócia de caixas de marmelada portuguesa. Diz-se até que nessa época seriam atribuídas ao marmelo propriedades curativas e seria até consumida como medicamento. Começou então a ser feito no século XVII um produto semelhante, mas usando laranjas, com uma consistência sólida, idêntica à da marmelada. Penso que não exclusivamente com laranjas amargas. Diz-se que no final do século XVIII James Keiller comprou um carregamento de laranjas de um navio português que se tinha abrigado de um temporal no porto de Dundee, na Escócia, e que as estava a vender a um preço baixo. Aparentemente, só depois de as ter comprado se apercebeu de que eram laranjas demasiado amargas e não dava para serem comidas como fruta. Deu-as à sua mãe que as transformou em doce, e possivelmente foi ela que inovou e introduziu a marmalade com uma consistência diferente, que permitia ser barrada.

Por essa época o que se comia ao pequeno almoço estava a sofrer alterações, em vez de ser uma caneca de cerveja com uma torrada a boiar, com a introdução recente do chá em Inglaterra e na Escócia, cada vez era mais popular um chá com uma torrada e, entre outras coisas, a marmalade começou a ser usada para barrar as torradas e a ser cada vez mais consumida. Assim, a família Keiller acabou por ser a primeira a produzir industrialmente e comercializar a marmalade, na sua fábrica de Dundee. Negócio este que cresceu e se estendeu para outras zonas, sendo na segunda metade do século XIX os maiores produtores mundiais de marmalade. Estima-se que em meados do século XIX produzissem cerca 1,5 milhões de potes de marmalade Keiller por ano. As empresas Keiller fecharam por volta de 1992, havendo outros produtores, e sendo um doce popular noutros países para além do Reino Unido, como é o caso, por exemplo, dos EUA, Escandinávia, Alemanha, Japão e Índia.

Não me parece que seja um doce muito apreciado por crianças, é amargo demais e, de facto, dizem que o seu consumo está em declínio, sobretudo entre os jovens. Quando questionado (por Felicity Cloake para o seu livro Red Sauce Brown Sauce - A British Breakfast Odyssey), sobre este assunto, Martin Grant da empresa Mackays, uma das principais empresas produtoras de marmalade, diz que não é objetivo deles atrair consumidores entre a população jovem, que quando o gosto se começa a desenvolver e a amadurecer e se começa a apreciar vinho, café e queijo, então aí está-se preparado para apreciar marmalade e se tornam fãs para toda a vida. Também desenvolvem as suas próprias preferências, pois o pedaços de casca de laranja em suspensão na geleia, podem ir desde pequenas partículas da casca moída até fatias mais ou menos espessas. Há umas marmalades mais ou menos inofensivas, outras têm uma personalidade mais forte, direi até mais amarga. 

O principais ingredientes são os mesmos para todas as marmalades, laranjas (em geral) amargas, açúcar, água, e um pouco de sumo de limão para que o pH seja adequado para que a pectina das laranjas (e da que é por vezes adicionada) desempenhe o seu papel na perfeição, para além da técnica e sensibilidade de quem a produz. Contudo, a algumas são adicionados outros produtos que as aromatizam, whisky, rum, champanhe ou especiarias são comuns. Estas versões são sobretudo preferidas por pessoas para quem o consumo de marmalade não é um hábito bem estabelecido. O meu caso...

Há algum tempo que compro a marmalade que consumo de uma produção artesanal da zona onde vivo, a Springfield Kitchen. Uma pequena empresa de um casal, que em 2004 começou a cultivar o seu novo jardim, e dado que a produção de vegetais e frutas começou a ser elevada, ofereciam a vizinhos e amigos, mas em 2013 decidiram fazer doces e chutneys para uma feira de Natal e a partir daí aumentou a produção. Vendem sobretudo em feiras e em pequenas lojas independentes.

Gosto muito da Seville Orange Marmalade with Cardamom & Saffron, uma ideia dada por uma companheira de viagem, originária de Mumbai (Bombaim), numa visita que fizeram a Goa em 2023. Tem um sabor exótico, complexo e sofisticado.

 

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Como por vezes não está disponível, alterno-a com a Spiced Orange Marmalade with Rum, que já tinha acabado qundo me lembrei de a fotografar.

 

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Provo-as sempre com a torrada com manteiga e marmalade, ou apenas com marmalade, para confirmar o que Heston Blumenthal refere na introdução da receita Sardines on Toast Sorbet (um prato excelente e que me deixou memórias inesquecíveis) do seu livro The Fat Duck Cookbook, em que diz que a marmalade de laranja que contém pedaços de fruta se for servida em tostas sem manteiga tem um sabor mais forte do que se as tostas forem barradas antes com manteiga. Confirmo sempre, e noto-o não só relativamente ao sabor a laranja, mas também ao das especiarias.

Estas diferenças culturais relacionadas com o consumo de alimentos são verdadeiramente interessantes. E embora haja evoluções, estou firmemente convencida que a tradição ainda tem um peso muito grande no consumo em cada região. No entanto, as alterações climáticas também vão ter um papel importante na mudança dos hábitos de consumo. Por exemplo, no caso das laranjas amargas, as laranjas de Sevilha de agricultura biológica poderão  caminhar para a extinção no próximo século se o número de explorações agrícolas continuar a desaparecer, as alterações climáticas afectarem as culturas, e as doenças dizimarem as árvores.

 

1ª Foto DAQUI

 

 

03
Set24

Doce de Morango com Chá Earl Grey - uma delícia!

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Gosto de fazer doces de fruta, tomate, figo e morango são os meus preferidos. Tomate é um doce conforto. Era, a par da marmelada, o que em criança via a minha Mãe fazer em grande quantidade, para o ano todo para uma família de oito pessoas. O de figo é uma hábito mais recente, porque é bom e porque nalguns anos a figueira dá muitos figos.

 

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Não tenho memória de ver a minha Mãe fazê-lo, ela cristalizava-os ou secava-os e comíamo-los durante o inverno. O de morango, o meu preferido, é outra história...

Em criança vivia numa pequena vila da Beira Baixa, os morangos que comia eram basicamente os que davam alguns morangueiros plantados no quintal. Tinham que ser divididos por oito bocas, eram cortados aos pedaços e misturados com (muito) açúcar, o suco do morango com o açúcar (por vezes diluído com um nadinha de água) formava um molho delicioso. Tenho mais memórias do molho dos morangos, do que propriamente dos morangos. Aqueles morangos eram um luxo! Não havia por ali onde comprar, comíamos apenas aqueles que cresciam ali ao lado de casa. Comer morangos era uma raridade! Doce de morango? Nem pensar, não chegavam para isso. 

Muitos anos mais tarde, quando comecei a fazer doces, já tinha acesso aos quilos de morango que quisesse. Mas  doce de morango ainda soava a luxo, e comecei a fazê-lo. Às vezes compro, mas gosto mais dos meus. Sobretudo desde que compreendi os processos moleculares que ocorrem quando se faz um doce de fruta, pois começaram a ficar bem melhores.

Comecei a variar também. Para além do doce de morango simples, faço doce de morango com baunilha e doce de morango e tomate. O ano passado experimentei uma nova variante - doce de morango e chá Earl Grey. Vi a receita no livro Red Sauce Brown Sauce - A British Breakfast Odyssey de Felicity Cloake e... não descansei enquanto não o fiz.

 

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Ficou tão bom! Repeti, mas decidi fazer de memória, e fiz asneira... Juntei o açúcar aos morangos e folhas de chá logo no início. O açúcar impediu as folhas de chá de hidratarem bem e ficaram mais duras. Era óbvio que isso ia acontecer... mas não pensei... Comi todo, mas não era a mesma coisa. Os morangos acabaram e tive que esperar (ansiosamente) quase um ano para o fazer de novo. Tenho comido de vez em quando. Com pão, bolachas, scones ou panquecas, com manteiga ou clotted cream

 

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Ainda tenho alguns frascos para os próximos meses. Depois... é esperar (ansiosamente) que haja morangos de novo... 

 

 

28
Mar24

Fecha-se uma porta e abre-se uma janela

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Os restaurantes passam por uma época complicada, são afetados em quase todos os países por custos mais altos, falta de pessoal... No entanto, tudo isso aqui no UK é ainda agravado pelo Brexit. A situação exige que se recorram a várias estratégias como, por exemplo, abrirem apenas para jantar (ou almoço), servirem menos carne ou terem menus mais simples. Mas muitos fecham, mesmo muitos! 

A cidade onde vivo não é propriamente um paraíso gastronómico, muito longe disso... Não é também uma cidade turística, ou uma cidade rica, o que agrava a dificuldade dos restaurantes independentes, e dificulta uma evolução.

Havia, no entanto, dois restaurantes que para mim eram oásis no meio da situação geral. Um deles era um café libanês, o Taz, que estava aberto até ao fim da tarde. O outro, um restaurante com uma cozinha atual, baseada na culinária inglesa, no centro da cidade, o Green Dragon.

O Taz era perto de minha casa, um porto seguro... Ia frequentemente para lá trabalhar, e comia o que fosse apropriado para a hora do dia, já que a oferta era variada. Ia lá almoçar muitas vezes, a sopa de lentilhas era excelente! Mas não era só a sopa, tudo era muito bom, a melhor comida do Médio Oriente que alguma vez comi. Bem confecionada, mais sofisticada do que é habitual, e bem apresentada. Para além de tudo isto, os preços eram muito razoáveis, o espaço bonito, e o ambiente muito agradável. Tinha sempre gente, clientes fiéis. Mas um dia fechou, e a minha vida ficou mais pobre.

 

Pratos do Taz

 

O Green Dragon, era num edifício medieval com estrutura de madeira, que tinha para sido transferido para aquele local (como muitos outros edifícios históricos da mesma rua), após a Segunda Guerra Mundial, em que esta cidade foi muito destruída. O espaço era bonito, mas sempre achei que faltava qualquer coisa de acolhedor naquele ambiente, a comida era muito boa.

 

Pratos do Green Dragon

 

A minha última refeição no Green Dragon

 

No verão passado jantei no Green Dragon, e pouco tempo depois soube que tinha fechado definitivamente. A minha vida ficou ainda mais pobre.

Mas diz-se que quando se fecha uma porta, se abre uma janela... Perto de minha casa havia uma loja que vendia cervejas, nunca me tinha apercebido, mas no Beer Gonzo, por detrás da loja, havia uma sala onde se podia beber cerveja. Na parede do fundo tem um conjunto de 18 torneiras, quase todas de cerveja, mas também uma ou duas de cidra e duas de vinho. No verão passado fecharam para obras. A sala por detrás da loja ficou melhor e mais visível, começaram a introduzir outros produtos, (bons) cafés, queijos, enchidos, tábuas de queijos e enchidos, e a venderem o melhor pão que aqui existe. E... cereja no topo do bolo... há dois meses começaram a ter pequenos pratos de quarta a sábado. A cozinheira... reconheci-a quando entrei, é a mesma do Green Dragon (pelo menos do meu último jantar) - Sarah Jenkins. A cozinha não pretende ser ao mesmo nível, as infra-estruturas não o permitem, e o objetivo não é o mesmo. Mas é muito boa, e a minha vida melhorou.

 

Pratos do Beer Gonzo

 

A situação atual obriga a procurar alternativas... janelas que se abrem, quando portas se fecham!

 

 

02
Mar24

Há dias com sorte! E o black pudding era muito bom.

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Está frio por aqui e uma chuvinha miúda constante... No últimos tempos tenho tido muito que ler (e não é lazer)... Acordei, apetecia-me um dia diferente, e pensei: "faça chuva ou sol, vou-me meter num autocarro e vou a Leamington Spa". A viagem demora cerca de 50 minutos. Se chovesse muito, iria a dois ou três sítios de que gosto, almoçava e regressava. Sempre tinha quase  duas horas de passeio de autocarro. Quando cheguei não chovia, aproveitei e fui logo à loja da Aubrey Allen.

 

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É sempre uma paragem obrigatória. Nem que seja apenas para "lavar os olhos" (como diz o meu amigo João). "Lavar os olhos" faz bem... e também comemos com eles. Mas, desta vez, até trouxe duas coisas. Pequenas, mas que me têm sabido muito bem, uma deliciosa manteiga e um black pudding.

 

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Nem queria acreditar quando olhei para a prateleira refrigerada e o vi - um Black Pudding da Fruit Pig Butchery em East Anglia. Tinha lido sobre ele há uns meses, no livro Red Sauce, Brown Sauce - A British Breakfast Odyssey da Felicity Cloake. Aparentemente é o único black pudding neste país que ainda é feito com sangue de porco fresco e não com sangue seco (que é mais fácil de adquirir). Isso estava bem indicado no rótulo:

 

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Sangue fresco de porcos locais (28%), Gordura de porcos Britânicos (24%), Aveia e Cevada Britânicas, Cebolas, Sal e Especiarias.

Não tenho grande conhecimento, nem muitos termos de comparação, para o black pudding, mas ela dizia que era diferente de todos os outros. Para o descrever usava adjetivos como " rich and creamy, luxurious, full and round in the mouth". Com isto esperava uma textura cremosa e um sabor forte, mas bem balanceado. 

No dia seguinte de manhã também chovia, e estava frio. Para o pequeno almoço, pus umas fatias de black pudding na air-fryer, torrei duas fatias do melhor pão que tenho aqui (da Lily & Fox Bakery - ou seja, de um casal do meu bairro que trabalhava em cinema e tv e resolveu mudar de vida e fazer pão, neste momento vendem em feiras e pop-ups, mas penso (e espero ansiosamente) que vão abrir uma padaria na esquina da minha rua). Com muita expetativa provei o black pudding. Uma base cremosa, mas os grão dos cereais conferiam uma descontinuidade de textura bem agradável. O sabor... muito rico e forte, mas não agressivo, aromático e picante. Delicioso! Um sabor muito elegante que se prolonga na boca por muito, muito tempo! Um luxo!

Apesar de bem diferentes, fez-me lembrar as morcelas frescas, acabadas de fazer, que ainda não tinham ido ao fumeiro,  que íamos comer grelhadas a casa da minha Avó nos dias de matança de porcos na fábrica, ou que o meu Pai trazia para casa. Lembro-me de as ver fazer, de as ver cozer, de antecipar o sabor delas, um aroma forte a cominhos. Também cremosas, também com sangue. Diferentes, mas igualmente deliciosas. Um luxo!

Um dia pedi ao meu Pai que escrevesse umas notas sobre a fábrica, sobre a forma como funcionava. Há uns anos digitalizei tudo. Fui procurar, e lá estava a descrição da forma como faziam as morcelas.

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Ainda bem que fui a Leamington Spa, apesar da chuva e do frio. Permitiu descobri coisas novas e reviver memórias antigas.

 

07
Set23

The Gannet - modern scottish cuisine, porque não se vive só da tradição...

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Não se vive só da tradição (pelo menos eu não vivo) e além de experimentar restaurantes e pratos tradicionais em Glasgow, quis experimentar uma cozinha mais inovadora. Alguma pesquisa e decidi ir ao The Gannet, com uma cozinha descrita no site do restaurante como modern Scottish e menus inspirados nos produtos da rede que criaram, ao longo dos seus 10 anos de existência, de pequenos produtores artesanais, recoletores e agricultores.

Tinha planeado passar um dos dia na zona do west end a visitar museus, passear nas ruas, ir ao jardim botânico... e planeei tudo para ir almoçar ao The Gannet. O menu de almoço pareceu-me atraente, pelo conteúdo e pelo preço (£ 38 - preço base).

A sala, com  um ambiente rústico, mas moderno, estava meio cheia, mas ao longo do almoço mais mesas foram sendo ocupada.

Para começar, dois aperitivo muito saborosos. O arenque frio e ácido, o frito de pernil quente com o interior cremoso, mas em que se sentia a textura das fibras da carne.

 

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Pickled Herring/ Pinhead Oatmeal/Preserved Lemon

Ham Hough Beignet

 

Havia a opção, mediante um pagamento suplementar, de ser servida uma ostra com os aperitivos iniciais, decidi pedir.

 

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Gigha Oyster / Vietnamese Dressing

 

Entretanto, chegaram fatias de dois bons pães e manteiga, a fazer a ponte para os pratos seguinte.

 

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Malted Sourdough & Wheaten Bread / Brenda's Butter

 

Havia três opções possíveis de entradas e pratos principais. Para a entrada escolhi o peito de pombo. A carne com uma textura fantástica, o seu molho e o puré de milho tornavam-na em verdadeira comida conforto, mas com uma apresentação lindíssima. Excelente!

 

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Newtonmore Pigeon Breast / Sweetcorn / Greenheart Salad

 

Para o prato optei pelo bacalhau fresco numa combinação, para mim, menos habitual, a do peixe com as groselhas. Um ótimo prato também, muito bonito, excelente a textura do peixe e muito saboroso.

 

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North Sea Cod / Gooseberry /Potato /Verjus /Leeks

 

A complexa pré sobremesa, com uma variedade de texturas e sabores, também prometia...

 

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Contudo, a sobremesa foi o ponto mais fraco do almoço. Tive pena, pois tinha visto fotos de sobremesas bastante mais elaboradas e aparentemente mais interessantes.

 

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Peach / Hazelnut / Rapberry Ripple

 

Era agradável, mas não achei que estivesse ao nível dos restantes pratos. Uma sobremesa mediana e pouco interessante, com um aspeto pouco atraente. Fez-me lembrar um post que aqui escrevi há cerca de 6 anos, Sobremesas - desconstrução por opção? .Como lá dizia, gosto bem mais de sobremesas que requerem um bom domínio técnico, que têm alguma complexidade e que não parecem que são uma forma de aproveitar algo que não correu bem. 

Globalmente foi um ótimo almoço, mas fiquei com pena que tivesse terminado assim. É um prazer e uma constante descoberta poder experienciar estas abordagens da cozinha que envolvem referências gastronómicas diferentes das minhas.

 

PS

À conta foi adicionado 10% de gorjeta, indicado no menu e muito habitual por aqui. Algo que começa a acontecer em Portugal e que tem causado alguma polémica...

 

1ª Foto DAQUI

 

 

31
Ago23

Cozinha Tradicional Escocesa no Mharsanta - se o jantar tivesse sido a outra hora seria bem diferente...

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Eu bem queria um jantar de cozinha escocesa... mas isso exigiu alguns ajustes que de certa forma me "trocaram as voltas". A escolha tinha recaído no Mharsanta, um restaurante no centro de Glasgow que usa produtos escoceses, trabalha preferencialmente com produtores locais, e oferece pratos tradicionais, a par com outros mais criativos mas sempre baseados em produtos da região. Quando fui marcar só havia mesa para as 18h e 45m. Não tinha outra oportunidade de lá ir... lá teve que ser... Mas, por mais esforço que faça, não me consigo habituar a estes horários tão comuns por aqui. 

Claro que jantar a uma hora destas tem consequências, e uma delas é que não tinha fome nenhuma. Analisei o menu... bem gostava de comer uma entrada e um prato... ainda tive esperança que a doses fosem pequenas, mas ao olhar para as mesas ao lado vi que não eram tão pequenas assim. Não podia mesmo! Fiquei apenas pelo prato. Achei que a Chicken Balmoral seria uma escolha interessante, um prato tradicional em que o peito de frango é recheado com haggis e servido com um molho de whisky. 

O haggis é um produto tradicional escocês composto de fígado, coração e pulmões de ovelha picados, por vezes também um pouco de carne de ovelha ou vaca picadas, misturados com sebo de bovino e aveia e temperado com cebola e especiarias. Esta mistura tradicionalmente era colocada num estômago de uma ovelha e aí cozinhada, atualmente é muita vezes usada numa tripa de plástico. De certa forma lembra-me o maranhos, um prato que cresci a comer. Já tinha comido anteriormente haggis, mas gostava de comer de novo e isso foi uma das razões que me levou a escolher a Chicken Balmoral.

 

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Chicken Balmoral - haggis stuffed chicken breast wrapped in pancetta & served with dauphinoise, savoy cabbage, bacon and a creamy whisky sauce

 

É bom quando um prato excede as nossas expetativas, e isso aconteceu, apesar da pouca fome... Um prato rústico, mas com uma grande riqueza de sabores muito bem equilibrados. Para o acompanhar half pint de uma lager da Tennent's, uma conhecida cervejeira escocesa fundada em 1556, cuja produção é feita a menos de 1 km do restaurante.

Soube-me muito bem, mas não tinha havido mesmo espaço para a entrada e nem sequer para uma sobremesa. Se o jantar tivesse sido a uma hora normal, tudo teria sido diferente...

 

1ª foto DAQUI

 

 

26
Ago23

Scottish Full-Breakfast - a tradição ainda é o que era!

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Tendo estado uns dias em Glasgow de férias, achei que era uma boa oportunidade para comer um Scottish Breakfast. Tinha acabado de ler um livro sobre o British Breakfast e queria provar um pequeno almoço escocês tradicional, com tudo a que tinha direito. Em pesquisas que fiz sobre os melhores pequenos almoços, surgia-me sempre o café Singl-end - Merchant City. Foi lá que me dirigi num sábado, e a primeira pergunta que me fizeram foi se tinha marcado... não, não tinha! Só me conseguiam arranjar mesa daí a duas horas, já perto do meio dia. Não dava... marquei para o dia seguinte. No domingo, enquanto esperava à porta, vi muita gente ir embora pela mesma razão que eu tinha ido na véspera.

O que é tradicional, nem sempre o foi, e como é inevitável vai evoluindo. O Full Breakfast (ou, de forma mais informal, Fry-Up) começa a ser referido no Reino Unido apenas no final do século XIX. Segundo Felicity Cloake, no livro Red Sauce, Brown Sauce - A British Breakfast Odyssey, possivelmente está relacionado com a emergência de uma classe média substancial que passou a ter bastante tempo de lazer e disponibilidade para uns pequenos almoços cozinhados e copiosos. Nem todos tomariam pequenos almoços tão completos e com tanta escolha, muito menos diariamente, mas o fry-up chegou para ficar. Com as mudanças de hábitos depois da II Guerra Mundial, resultantes das mulheres começarem a trabalhar e da maior parte das pessoas não terem empregados, começou a ser consumido menos regularmente. Agora, para a generalidade das pessoas, o pequeno almoço são cereais ou uma torrada com manteiga e um doce de fruta. O full breakfast come-se ocasionalmente, em fins de semana. Por vezes até a outras horas que não pela manhã, é comum estar disponível o dia todo.

Os lugares que o oferecem são muitos e variados - restaurantes, cafés, pubs... Geralmente há uma versão maior, outra com o mesmos elementos mas em menor quantidade, e depois diversas variações com alguns dos elementos habituais. A composição não é rígida, mas o bacon está sempre presente, por vezes streaky bacon (o mais comum para nós, da barriga do porco) ou, mais frequentemente, back bacon (que inclui sobretudo o lombo e um pouco da barriga, e tem muito menos gordura), ovos estrelados, ou escalfados, e salsichas. Em geral tem tomates grelhados, cogumelos, baked beans, hash browns (fritos de batata e cebola raladas, um componente importado dos EUA), e pão torrado. A estes componentes básicos juntam-se regionalmente outros, ou alguns são substituídos: na Escócia black pudding (um enchido feito de sangue de porco e aveia), por vezes haggis (um enchido de vísceras de ovelha e aveia), e tattie scone (na realidade um tipo de panqueca espessa em que o ingrediente principal é puré de batata); também black pudding, white pudding (um outro enchido de aveia e gordura de porco ou vaca) e potato bread ou soda bread na Irlanda do Norte; e berbigões e uns fritos de algas em Gales.

Um full breakfast é pesado, normalmente não me atrairia muito, mas a verdade é que (muito) ocasionalmente gosto, e neste caso interessava-me também provar com as diferenças regionais.

Entrei no Singl-End e logo à esquerda havia um balcão com uma enorme variedade de bolos, mas eu estava ali para o pequeno almoço, desta vez não havia lugar para eles. Sala grande, com dois andares, e com pouca luz.

Havia várias opções para além do Scottish Breakfast, de que há também as versões vegetariana e vegana, mas eu estava ali para o tradicional. Perguntaram se queria Ketchup ou Brown Sauce. Normalmente não ponho nenhum, mas não foi o caso desta vez. A Felicity Cloake avaliou qual preferiam as pessoa com quem contactou durante a viagem para escrever o livro, havia uma grande divisão, e também aqueles que, como eu, não punham nenhum dos dois. Estando menos familiarizada com o Brown Sauce, pedi esse. Chegou numa tacinha pequena, provei, mas usei pouco. Para acompanhar, um sumo de laranja natural e um Breakfast Tea com umas gotas de leite. 

 

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Poached eggs, streaky bacon, Loch byre link sausage, Stornoway black pudding, potato scone, grilled tomato, smoky baked beans, toasted sourdough bread

 

Soube-me bem, mas o almoço nesse dia foi muito leve. Gostei do black pudding, menos do potato scone. Nos dias seguintes continuei a visitar a cidade que tem edifícios muito bonitos, museus interessantes, bons parques e um conjunto de street art que vale a pena ver, mas também aproveitei para provar o que é tradicional, e ainda novas propostas... 

 

1ª Foto DAQUI

 

 

04
Abr23

As saudades de um bom pão proporcionaram-me muito mais do que um bom pão!

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A cidade onde estou não é um paraíso gastronómico, está muito longe de o ser. Arranja-se um pão aceitável, mas não mais do que isso. Andava com saudades de um bom pão e numa sexta-feira recente acordei com vontade de resolver esse assunto.

Sabia que a alguns quilómetro de distância havia uma padaria, The Bakery at Hampton Manor, fundada em 2021, que abria apenas de quinta a domingo das 9 às 12 horas. A responsável pela produção é uma jovem da Coreia do Sul,  Min Go, que depois de trabalhar alguns anos a escolher e comprar produtos para uma mercearia de alta qualidade na Coreia, decidiu vir para Inglaterra aprender a fazer pão e depois aperfeiçoou as suas competências em estágios na Dinamarca. Fui ver como lá chegava, bastavam uns 20 minutos de comboio e depois menos de 10 minutos a pé. Achei que era um bom plano para uma manhã de sexta-feira. Meti-me no comboio, saí em Hampton-in-Arden, onde não saíu mais ninguém, caminhei uns 7 ou 8 minutos, sem ver ninguém, e finalmente entrei na The Bakery onde havia muita gente.

Funciona no espaço de um restaurante (Smoke), daí o horário, para além de venderem pão, bolos, manteiga, queijos... também se podem lá comer os bolos e beber um café. Passados uns minutos, estava sentada a comer um excelente bolo feito com a massa do croissant e recheado de chocolate e avelãs, e a beber um café. 

 

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No saco tinha um pão, que esperava que fosse bom, e que saiu desta prateleira:

 

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Recordei que um dos restaurantes do hotel Hampton Manor tinha tido em tempos uma estrela Michelin, mas tinha fechado. Planeei ir a um dos dois atuais (Smoke e Grace & Savor). Uns dias depois soube que o Grace & Savour foi um dos novos restaurantes em Inglaterra a que foi atribuída uma estrela Michelin. 

Pequeno almoço tomado e pão no saco, foi altura de regressar. Não me cruzei com ninguém no caminho até à estação, não havia ninguém na estação, mas o comboio parou na plataforma à hora programada. Durante o regresso, achei que seria um bom plano para o almoço provar o pão, mas precisava de arranjar acompanhamentos à altura. Lamentei não ter trazido uma manteiga e um queijo da padaria, tive que fazer outros planos.

Passei numa loja especializada em cervejas, e que vende alguns outros produtos, e comprei um enchido artesanal produzido na Escócia.

 

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A East Coast Cured é uma pequena empresa que produz enchidos fundada por um casal, Steven e Susie Anderson, que depois de umas férias na Europa, concluíram que os enchidos disponíveis na zona em que viviam na Escócia estavam muito longe, em termos de qualidade, daqueles que tinham comido durante essa viagem. Decidiram meter mãos à obra, abriram uma pequena charcutaria e loja num bairro portuário de Edimburgo, e especializarem-se na produção de produtos fabricados com carne escocesa, de quintas locais. A qualidade da sua gama de produtos tem sido reconhecida e têm ganho variadíssimos prémios.

Para o Porcini & Truffle Salami que comprei, um dos seus produtos de maior sucesso, adicionam à carne de porco boletus edulis em pó, queijo parmesão ralado, e um pouco de óleo de trufa. Um enchido com um sabor forte, diferente do habitual, mas muito bom. Um enchido que tem recebido vários prémios (2 Stars Great Taste Awards 2020, Winner of Artisanal Product, Scotland Food & Drink Excellence Awards, 2019 & Winner of Meat Category, Scotland Food & Drink Excellence Awards 2018).

Comprei também um queijo produzido artesanalmente nos Cotswolds pela Simon Weaver Organic, uma queijaria artesanal fundada em 2005, numa quinta onde três gerações da família Weaver têm produzido leite. O seus produtos orgânicos e artesanais têm recebido vários prémios. A minha escolha recaíu sobre o já premiado Cotswold Blue Veined Brie.

 

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No frigorífico tinha cerveja de uma empresa local criada em 2015, a Dhillon's Brewery. Tirei uma lata de uma Golden Pale Ale, que descobri depois também ter recebido vários prémios. Curiosamente o Head Brewer da Dhillon's, Pedro Oliveira, é português.

 

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Quando acordei só queria um bom pão, acabei por reunir um conjunto de produtos muito interessantes, de empresas criadas recentemente por jovens empreendedores e que levam muito a sério o seu trabalho, que tem sido amplamente reconhecido e premiado.

O almoço foi bom, mas o resto da tarde também. Ocupei-a a saber mais sobre o que tinha acabado de comer e beber. As saudades de um bom pão proporcionaram-me muito mais do que um bom pão!

 

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