Sabores Açoreanos Aqui Tão Perto
Medo do Mar (2011) de Catarina Branco - técnica: papel recortado à mão
uma das 3 obras desta artista que estão expostas no restaurante Terraço durante esta semana gastronómica
“Portugal de Norte a Sul” é uma iniciativa muito interessante do restaurante Terraço do Hotel Tivoli onde periodicamente, desde de Abril de 2014, a nossa gastronomia regional é apresentada. O objectivo é trazer ao Terraço cozinha das várias regiões de Portugal, sendo cada uma representada por um restaurante, vinhos e outros produtos da região, seleccionados por Fátima Moura. Depois do Porto, Algarve, Alentejo, Trás-os Montes e Ribatejo chegou a vez dos Açores. O restaurante escolhido para, de 19 a 28 de Fevereiro, representar as 9 belíssimas ilhas do Açores foi o restaurante Anfiteatro da Escola de Formação Turística e Hoteleira de Ponta Delgada.
Aceitei o convite para o jantar inaugural, onde alguns pratos do menu foram apresentados, com alguma expectativa. Conheço algumas das ilhas dos Açores e considero-as fascinantes. Pelas belezas naturais e pela quantidade e diversidade de produtos únicos e com muita qualidade. Mas reconheço que a culinária local precisa de, sem se descaracterizar, saltar para um outro nível, mais ajustado com as tendências contemporâneas. Tinha curiosidade de ver como a cozinha regional e os seus produtos eram apresentados numa versão mais actual, de quem faz a formação dos novos cozinheiros que no futuro certamente desempenharão um papel importante na oferta gastronómica açoriana.
No Tivoli estavam muitos dos produtos que tanto me encantam: os lacticínios e em particular os queijos, os ananases e o curioso limão galego, os doces de fruta e os licores, o inhame, o chá, os vinhos, os enchidos e as conservas de atum e de lapas (ainda experimentais).
No início da refeição sobre a mesa estava o óptimo Bolo de Lêvedo e Massa Sovada. Para os acompanhar a tão característica pimenta da terra e ainda uma excelente manteiga das Flores e queijo de cabra da conteira. Não conhecia mas a conteira é uma planta cujas folhas eram tradicionalmente usadas para embrulhar o queijo, tradição que alguns produtores estão actualmente a recuperar.
Seguiu-se
Creme de Nabos de Santa Maria com Espadarte
Inspirado num dos pratos mais simbólicos de Santa Maria, o Caldo de Nabos, que é confeccionado com uma espécie de nabo endémico da ilha de Santa Maria, pequeno e de cor escura. Neste caso um creme com forte sabor a nabo e um pouco amargo, com pequenos cubos de nabo, que davam um interessante contraste de textura. O espadarte fumado, com o seu sabor forte, conseguia “aguentar” a sopa de nabo e com o seu sal “domava” um pouco o gosto amargo.
Nos Açores chama-se chicharro a uma espécie de carapau, um pouco diferente da mais comum no continente. Chicharro, ou chicharrinho quando é pequeno, já carapau designa o peixe grande. Curiosamente, é exactamente ao contrário do que acontece aqui no continente. Foram-nos servidos uns agradáveis chicharrinhos fritos depois de passados por farinha de milho.
Chicharros, Inhame e Pimenta da Terra
Veio então o prato de peixe
Boca Negra, Arroz de Lapas e Açafroa
O boca negra é o peixe a que aqui chamamos cantaril. Foi-nos servido com uma excelente textura, e com um saboroso arroz de lapas, corado e aromatizado com açafroa (também conhecida por açaflor ou açafrão bastardo), um condimento obtido das folhas das flores do cártamo.
O prato de carne era inspirado nas Sopas do Espírito Santo, que inevitavelmente integram as ementas das tradicionais festas do Espírito Santo. Há quem diga que são originárias da Terceira ou do Faial, mas actualmente comem-se em todas as ilhas, e mesmo em todas as partes do mundo em que há açorianos.
Sopas do Espírito Santo
Para concluir a refeição um prato de queijos dos Açores. Fiquei a saber que a produção de queijo nos Açores corresponde a 50% da produção nacional. Para além destes houve ainda oportunidade de desfrutar de um excelente Queijo da Ilha de São Jorge com 24 meses.
Queijos São Miguel, Morro curado e Pico
E finalmente
Pudim de Feijão com Sorbet de Maracujá
O pudim de feijão era uma sobremesa de quem tinha poucos recursos e a fazia adoçando feijão cozido, e que aqui foi recuperada. O maracujá, um fruto que existe muito nos Açores, com o seu inebriante perfume dava elegância à sobremesa. No final ainda uma queijada de Vila Franca do Campo. Já não havia espaço para ela, mas não lhe podia resistir… Soube-me tão bem no dia seguinte ao lanche com um chá dos Açores.
Para acompanhar a refeição óptimos vinhos dos Açores: Curral Atlantis, Arinto dos Açores 2015 DO Pico; Terras de Lava 2014, IG Açores; Tinto Vulcânico 2014, IG Açores; e para a sobremesa Czar 2009 DO Pico.
Desta vez este percurso de Portugal de Norte a Sul deslocou-se para Oeste. E foi tão bom poder revisitar à mesa uma parte do nosso país riquíssima do ponto de vista gastronómico e que pouco conhecemos. Foi bom poder desfrutar de uma cozinha açoriana mais contemporânea.
Que surjam mais oportunidades destas! Vale a pena ir!
Restaurante Terraço- Hotel Tivoli - Av. da Liberdade, 185 - Lisboa - Tel: 213 198 934
1ª foto DAQUI