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Assins & Assados

Assins & Assados

28
Abr25

Um chocolate único! Primeiro estranha-se, depois entranha-se...

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Quando abri a embalagem do Solomons Gold 75% Dark Nib e o provei, estranhei... tive que pensar se gostava ou não. Um chocolate tão diferente! Intenso e com um forte sabor a fumo, complementado com notas de tabaco e cabedal. Uma textura suave, que contrasta com os nibs de cacau adicionados.

É produzido na Nova Zelândia, com cacau de plantações nas Ilhas Salomão, que têm um solo vulcânico responsável pelo sabor característico deste chocolate. É adoçado com açúcar não refinado de seiva de coco, um açúcar de palma produzido a partir da seiva do caule do botão da flor do coqueiro. Primeiro estranha-se, mas depois entranha-se... E rapidamente percebi que gostava muito. Um chocolate único!

As minhas aventuras com os chocolates bean to bar estão para continuar. Os últimos 8 anos, com os cerca de 400 chocolates diferente que provei, têm sido uma fascinante descoberta do chocolate e da sua imensa variedade! 

 

 

 

17
Abr25

SÁLA de João Sá e a sua cozinha única que reflete identidade e local

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Há muito que queria voltar ao Sála do João Sá. Fui lá algumas vezes na altura em que abriu, mas estive uns anos sem voltar. Tentei marcar umas vezes, mas com pouca antecedência, e nunca consegui. Finalmente planeei bem as coisas e num sábado recente almocei na primeira mesa que se vê na foto acima.

O mesmo espaço simples, mas acolhedor e elegante, com detalhes que lhe dão personalidade, com a cozinha à vista e a porta diretamente para a rua. Contudo, a comida oferecida mudou muito. Apesar de em visitas anteriores ter gostado bastante, o nível da cozinha do João Sá agora é outro, reflete uma maior maturidade, que justifica a estrela Michelin atribuída ao restaurante há cerca de um ano. Optei pelo menu "À procura de nova texturas" um menu que o João Sá diz traduzir a sua visão de Lisboa, que considera ter uma culinária vibrante resultante da influência das viagens, de que era ponto de partido e chegada, e de quem chegou vindo de outras paragens. Assim, todos os sabores do mundo que confluíram em Lisboa, bem como a ligação de Portugal com o mar, e em particular o Oceano Atlântico, influenciaram este menu.

Ao chegar serviram-me um caldo, inspirado no caldo verde. Se visualmente não era possível relacioná-los, o sabor denunciava a fonte de inspiração. Um sabor conforto que preparava para a aventura que se seguiu.

 

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Caldo verde, Óleo de Algas, Pimentão Fumado

 

Foi então servida uma sequência de pequenos pratos caracterizados por uma apresentação muito cuidada, sabores fortes, texturas variadas e muito bem trabalhadas.

 

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Berbigão na Caruma

 

Gosto muito de berbigão, este tinha um sabor levemente fumado, e o caviar contribuía com uma componente salgada, um reforço do umami, e o seu sabor complexo, que elevavam o berbigão para outro nível.

No início serviram-me um Champagne, mas os pratos seguintes foram acompanhados por vinho branco, o Insula - Arinto dos Açores, 2018.

Trouxeram em seguida uma misteriosa caixa com o logo do restaurante. Lá dentro um pequeno snack, uma muamba de galinha servida entre duas folhas crocantes de pele de galinha desidratada.

 

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Muamba de Galinha

 

A gamba que se seguiu era lindíssima, visualmente e em termos de sabor, sendo servida entre duas placas crocantes, cujo formato lembrava algas, mas com um sabor a pimentão.

 

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Moqueca de Gamba

 

O mar também estava presente no prato seguinte.

 

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Ostra, Caldo de Cebola, Gotas de Cavala

 

Esta sequência de pratos foi interrompida por um momento mais terra a terra e com características bem diferentes. Um corte bem vindo, que preparou os sentidos para poder desfrutar bem da complexidade de todo o resto do menu.

 

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Pão,  Manteiga Caramelizada, Azeite Metáfora de Trás-os-Montes.

 

Seguiram-se dois pratos de marisco deliciosos. Um primeiro refletia influências de sabor de outras paragens, sendo o umami da santola complementado e intensificado com o das ovas. No segundo, o sabor do marisco era complementado com notas doces do caramelo e da castanha.

 

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Santola, Caril Goês, Harissa

 

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Lavagante, Caramelo, Castanha

 

Depois de tanto "mar" chegou a altura da "terra", num prato delicioso de cogumelos. Curiosamente um ingrediente também com alto teor de umami. Em japonês a palavra umami significa delícia. E por muitas e variadas razões estes pratos eram deliciosos.

 

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Fricassé de Cogumelos, Morilles, Trufa Preta 

 

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Cuscos, Coentrada, Bivalves

 

O prato de cuscos é visualmente muito impactante. Tanto que é um dos pratos referidos no texto que surge no Guia Michelin sobre o Sála. Referem-no como sendo um prato tecnicamente simples, mas tremendamente visual e saboroso que os encantou pela sua forma de combinar os cuscos, que ficam completamente verdes, com o mar. A mim também me encantou.

Com os pratos seguintes bebi um vinho do Douro, o Indie Xisto tinto, 2021. Com ele chegou um prato mais arriscado, uma caldeirada de enguias. Gostei muito! O sabor da caldeirada é um sabor muito nosso.

 

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Enguia, Caldeirada, Alho Negro

 

Era possível vir um prato ainda mais delicioso? Ele aí estava, imponente e um luxo!

 

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Robalo, Espargos Verdes, Caviar

 

O último prato salgado era visualmente mais estranho e difícil de identificar. Mas o sabor denunciava-o, era um arroz de polvo com algas.

 

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Polvo, Algas, Arroz

 

Tinha chegado a hora das sobremesas. Na primeira, um gelado com um ingrediente pouco comum, a calabaceira, também conhecida por baobá. Um ingrediente que, tal como outros sabores em pratos anteriores, reflete as origens angolanas do João Sá e as suas memórias de sabores. Acompanhava-o um pequeno recipiente com pedaços da polpa da calabaceira, para nos podermos familiarizar com ela se assim o desejássemos.

 

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Calabaceira | Mangericão |Lima

 

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Tomilho | Azeite | Brioche

 

Com o chá chegaram alguns petit fours, mas o serviço estava a terminar e o João Sá veio à mesa e ficámos a conversar algum tempo. Nem me lembrei da foto. Mas valeu a pena, é que a conversa foi quase tão boa como o almoço.

Impressionante o funcionamento da cozinha mesmo ali ao lado, tudo corre de forma calma e eficiente. Um bom serviço de sala é fundamental para uma boa experiência, e o do Sála foi muito bom e muito simpático.

A cozinha do João Sá evoluiu muito, sente-se uma grande maturidade. Reflete muito as suas memórias de sabores, e as nossas também, e gostei muito disso. A comida é central para a identidade, individual e do grupo, e é interessante pensar no que define as características de uma cozinha de um dado país / cultura. É um assunto complexo! Não é necessariamente a componente visual, nem os ingredientes, embora estes possam também ser importantes. Mas há notas de sabor que funcionam como marcadores, referidas num artigo de Claude Fischer, de que falei num outro post, como "princípios do sabor", e que são complexos olfativos e gustativos típicos de uma determinada culinária. É sobretudo isso que na cozinha do João Sá define a identidade e o local, uma cozinha que só pode estar ali, que é única.  

 

SÁLA - Rua dos Bacalhoeiros, 103 - Lisboa

 

1ª foto do site do restaurante

08
Abr25

É moda não gostar / desvalorizar o fine dining?

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Tenho reparado nos últimos tempos que, mais frequentemente do que alguma vez me lembro, no que oiço, em programas que vejo, no que leio, se desvaloriza o fine dining. É moda?

 

Não citando fielmente, e não pretendendo ser exaustiva, mas apenas reproduzir de memória o que me ficou, diz-se:

 

- Mas ainda alguém quer fine dining?

- O que os clientes querem é comida conforto, de prato cheio.

- Não se está à vontade naqueles ambientes.

- O prazer perde-se com tanta técnica.

- Quem é que tem tempo para estar três horas à mesa?

- O futuro é comida de partilha, de Mãe, comida de fogo...

- Cozer num saco de plástico não envolve amor.

- A cozinha experimental já foi longe demais.

- Sai-se com fome, uns pratos enormes com quase nada...

 

Ainda me choca mais que muitas destas coisas sejam ditas por chefes ou pessoas com uma ligação estreita à gastronomia. Há uns meses alguém até perguntava se restaurantes de fine dining tinham razão de existir. Absurdo!

 

O fine dining é, e sempre foi, para um nicho de mercado pequeno. Houve um período, em tempo de vacas mais gordas do que aquele em que vivemos, em que mais pessoas tiveram curiosidade e, sobretudo, disponibilidade económica e acesso, e em que muitos restaurantes abriram. Nunca me pareceu sustentável o número e a dimensão dos espaços. Um bom restaurante de fine dining requer um grande investimento, recursos humanos especializados, produtos de qualidade, um bom domínio técnico, e é inevitavelmente caro, tem mesmo que ser. Sempre achei que com o tempo se chegaria a um equilíbrio. Os tempos mudaram e a oferta teve também que se adaptar ao público e às condições de vida atuais. Tinha que acontecer. Parece-me consensual.

 

O que não entendo é a comparação que se faz com outros tipos de cozinha, quase uma ou outra. Nem ouvir dizer, sentindo algum regozijo na voz de quem o diz, que o fine dining acabou.

 

Todos gostamos de comida de prato cheio, todos gostamos de ambientes descontraídos, alguns gostam de ambientes mais formais, de um serviço mais cuidado, outros não... Tudo é válido e não há que escolher entre um ou outro tipo de cozinha, ou de restaurante. Nem há um futuro... há muitos, muitos futuros. Porque há muitas aproximações à cozinha, porque há muitas refeições com muitos propósitos diferentes, porque há chefes e clientes diferentes, com interesses, gostos e expetativas variadas. 

 

Gosto muito de restaurantes de fine-dining, sinto verdadeiramente a falta destas experiências, do rigor e sofisticação do que se come, da cozinha personalizada que nos transmite uma visão particular e única, baseada num percurso de vida de um chefe, do cuidado com que sou tratada... Tem um preço alto, mas tem que se considerar o que nos dão... Só tenho pena de não poder ir mais vezes. Uns meses sem ir e começo a sentir uma certa ansiedade... E gosto muito de ir sozinha, para poder desfrutar de tudo sem distrações, bem focada na experiência de que estou a usufruir. E sim, consigo arranjar três horas, ou quatro ou cinco se necessário... não custam a passar e valem cada minuto.

 

Foto -  Cauliflower - Chive - Gooseberry, Restaurante Land - Birmingham (uma cozinha de autor, não exatamente um restaurante de fine dining)

 

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Comentários recentes

  • Paulina Mata

    Saí anónima... mas fui mesmo eu quem respondeu.

  • Anónimo

    Ui!!!! Que pergunta difícil! Não sei responder... ...

  • Anónimo

    De início parabenizo a descrição elegante e delica...

  • Luis Filipe Costa Piteira

    Já paguei, sozinho, esse preço e mais em restauran...

  • Anónimo

    Obrigado pela gentileza da resposta. Boa Páscoa.