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Assins & Assados

Assins & Assados

24
Abr23

É um coelho? É um pato? É o The Chocolate Dabbit!

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Um pato? Um coelho? Ambos? Esta imagem ambígua surgiu pela primeira vez na revista de humor alemã Fliegende Blatter, publicada em Munique em Outubro de 1892.  Foi uma das imagens usadas pelo psicólogo americano Joseph Jastrtow, em 1899,  para mostrar que a perceção não é apenas um produto do estímulo, mas também da atividade mental, ou seja, que vemos tanto com a mente como com os olhos.  Aparentemente, Jastrow relacionou a rapidez com que uma pessoa muda a sua percepção do desenho e alterna entre os dois animais, com a rapidez de funcionamento do seu cérebro e a sua criatividade.

Sendo uma imagem ambígua, a perceção depende das expetativas, da experiência de vida e da forma como a atenção está focada no momento. Outros estudos demonstraram que consoante a época do ano as pessoas percecionavam a imagem de uma forma diferente, na Páscoa predominantemente como um coelho, em outubro como um pato. 

Um chocolate com esta imagem  - The Chocolate Dabbit - foi desenvolvido por Heston Blumenthal para a cadeia de supermercados Waitrose.

 

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Chocolate negro recheado com chocolate branco com açúcar caramelizado e sal.

 

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Vi o The Chocolate Dabbit e achei de imediato que reflectia a abordagem de Heston Blumenthal à cozinha, em que expetativas e memórias são muito conscientemente usadas para modelar a experiência pessoal de cada um, e um prato é sempre muito mais do que o estímulo físico. Estava também relacionado com o conceito de Gastronomia Quântica criado e difundido por Blumenthal, que o define como a prática ou arte de escolher, cozinhar e comer com uma perspectiva quântica (uma coisa pode existir no mínimo em dois estados diferentes ao mesmo tempo). Ou seja, basicamente significa que tudo pode ser visto de um número infinito de maneiras e o que experimentamos é determinado pela perspectiva que escolhemos, pelo momento que vivemos...  Além disto, uma forma cuja perceção é associada à criatividade, tem também tudo a ver com o trabalho do Heston Blumenthal.

Comprei-o porque assim que vi o The Chocolate Dabbit fiz todas estas associações, porque queria prová-lo, e também por ser o último produto criado por Heston Blumenthal e a sua equipa para a Waitrose. Uma longa parceria que durou 12 anos e terminou com este produto. Uma das razões apontada por alguns foi a imprevisibilidade de Blumenthal, ao que ele reagiu dizendo "Unpredictable to me is a Nonlinear Process that turns to Creativity".

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Habituei-me nos últimos 12 anos a sempre que ia a um supermercado Waitrose trazer um dos produtos criados por Heston Blumenthal. Eram bons e aquelas embalagens eram irresistíveis!  Um hábito que terminou com o The Chocolate Dabbit, um produto cheio de significado.

 

 

06
Abr23

O poder das nossas escolhas

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Encontrei esta senhora no fim de semana passado no M Shed em Bristol, o museu sobre a história da cidade e de pessoas que lá vivem ou viveram. Mary Anne Galton, estava lá devido ao seu papel na luta contra a escravatura. Quando tinha cerca de 12 anos, depois de saber que a produção de açúcar envolvia trabalho de escravos, deixou de o comer. Esta escolha, que envolvia sacrifício pessoal e que foi razão para a ridicularizarem e insultarem, foi uma forma de afirmar os seus princípios e de protestar contra o comércio de escravos. Quando foi viver para Bristol, em 1829, filiou-se na Clifton Female Anti-Slavery Society e convenceu muitas outras pessoas a protestarem da mesma forma e, em 1833, quando da abolição da escravatura, havia mais de 300 mil pessoas que tinham deixado de comer açúcar.

A minha filha mais nova estava a explicar isto o meu neto e disse-lhe: "Estás a ver, com a nossa carteira e a forma como gastamos o nosso dinheiro podemos protestar e mudar a coisas. É por essa razão que não compro nada que não seja vegano."

Hoje estava a dar uma vista de olhos a outros blogs e ao ler o post de Pedro Correia, Trocar o Real pelo Digital, no Delito de Opinião lembrei-me desta conversa, mas também de como tenho sentido cada vez mais a necessidade de comprar no comércio local, de evitar o online, sobretudo das grandes plataformas (para pequenas empresas pode ser a única forma de sobreviverem). Mas o comodismo por vezes troca-me as voltas... Contudo, no bairro onde vivo muitas das lojas lembram-me isso diariamente com letreiros que dizem qualquer coisa como Shop Local - Use it or Lose it! . E tenho visto perderem-se muitas...

Lembrei-me também de que há cerca de um ano, encomendámos o jantar. Fomos seguindo o percurso do estafeta que o ia entregar, ouvimo-lo chegar... e depois de ouvir um ruído junto à porta, ouvimo-lo partir sem bater. Ao abrir a porta, deparámo-nos com o nosso suposto jantar:

 

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É verdade que com um telefonema a expor a situação minutos depois o pagamento tinha sido reposto na conta, mas também é verdade que nunca mais pedi comida para ser entregue. Já antes me sentia desconfortável com as altas taxas cobradas aos restaurantes pelas grandes plataforma e com a situação precária de quem entrega. Esta foi a gota de água. Algo correu mal, a comida possivelmente foi mal acondicionada ou mal arrumada para a viagem, o saco de papel ficou molhado e tudo caiu no chão. Inútil seria criticar a falta de brio do estafeta. Os problemas são outros, bastante mais complexos...

 

 

 

04
Abr23

As saudades de um bom pão proporcionaram-me muito mais do que um bom pão!

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A cidade onde estou não é um paraíso gastronómico, está muito longe de o ser. Arranja-se um pão aceitável, mas não mais do que isso. Andava com saudades de um bom pão e numa sexta-feira recente acordei com vontade de resolver esse assunto.

Sabia que a alguns quilómetro de distância havia uma padaria, The Bakery at Hampton Manor, fundada em 2021, que abria apenas de quinta a domingo das 9 às 12 horas. A responsável pela produção é uma jovem da Coreia do Sul,  Min Go, que depois de trabalhar alguns anos a escolher e comprar produtos para uma mercearia de alta qualidade na Coreia, decidiu vir para Inglaterra aprender a fazer pão e depois aperfeiçoou as suas competências em estágios na Dinamarca. Fui ver como lá chegava, bastavam uns 20 minutos de comboio e depois menos de 10 minutos a pé. Achei que era um bom plano para uma manhã de sexta-feira. Meti-me no comboio, saí em Hampton-in-Arden, onde não saíu mais ninguém, caminhei uns 7 ou 8 minutos, sem ver ninguém, e finalmente entrei na The Bakery onde havia muita gente.

Funciona no espaço de um restaurante (Smoke), daí o horário, para além de venderem pão, bolos, manteiga, queijos... também se podem lá comer os bolos e beber um café. Passados uns minutos, estava sentada a comer um excelente bolo feito com a massa do croissant e recheado de chocolate e avelãs, e a beber um café. 

 

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No saco tinha um pão, que esperava que fosse bom, e que saiu desta prateleira:

 

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Recordei que um dos restaurantes do hotel Hampton Manor tinha tido em tempos uma estrela Michelin, mas tinha fechado. Planeei ir a um dos dois atuais (Smoke e Grace & Savor). Uns dias depois soube que o Grace & Savour foi um dos novos restaurantes em Inglaterra a que foi atribuída uma estrela Michelin. 

Pequeno almoço tomado e pão no saco, foi altura de regressar. Não me cruzei com ninguém no caminho até à estação, não havia ninguém na estação, mas o comboio parou na plataforma à hora programada. Durante o regresso, achei que seria um bom plano para o almoço provar o pão, mas precisava de arranjar acompanhamentos à altura. Lamentei não ter trazido uma manteiga e um queijo da padaria, tive que fazer outros planos.

Passei numa loja especializada em cervejas, e que vende alguns outros produtos, e comprei um enchido artesanal produzido na Escócia.

 

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A East Coast Cured é uma pequena empresa que produz enchidos fundada por um casal, Steven e Susie Anderson, que depois de umas férias na Europa, concluíram que os enchidos disponíveis na zona em que viviam na Escócia estavam muito longe, em termos de qualidade, daqueles que tinham comido durante essa viagem. Decidiram meter mãos à obra, abriram uma pequena charcutaria e loja num bairro portuário de Edimburgo, e especializarem-se na produção de produtos fabricados com carne escocesa, de quintas locais. A qualidade da sua gama de produtos tem sido reconhecida e têm ganho variadíssimos prémios.

Para o Porcini & Truffle Salami que comprei, um dos seus produtos de maior sucesso, adicionam à carne de porco boletus edulis em pó, queijo parmesão ralado, e um pouco de óleo de trufa. Um enchido com um sabor forte, diferente do habitual, mas muito bom. Um enchido que tem recebido vários prémios (2 Stars Great Taste Awards 2020, Winner of Artisanal Product, Scotland Food & Drink Excellence Awards, 2019 & Winner of Meat Category, Scotland Food & Drink Excellence Awards 2018).

Comprei também um queijo produzido artesanalmente nos Cotswolds pela Simon Weaver Organic, uma queijaria artesanal fundada em 2005, numa quinta onde três gerações da família Weaver têm produzido leite. O seus produtos orgânicos e artesanais têm recebido vários prémios. A minha escolha recaíu sobre o já premiado Cotswold Blue Veined Brie.

 

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No frigorífico tinha cerveja de uma empresa local criada em 2015, a Dhillon's Brewery. Tirei uma lata de uma Golden Pale Ale, que descobri depois também ter recebido vários prémios. Curiosamente o Head Brewer da Dhillon's, Pedro Oliveira, é português.

 

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Quando acordei só queria um bom pão, acabei por reunir um conjunto de produtos muito interessantes, de empresas criadas recentemente por jovens empreendedores e que levam muito a sério o seu trabalho, que tem sido amplamente reconhecido e premiado.

O almoço foi bom, mas o resto da tarde também. Ocupei-a a saber mais sobre o que tinha acabado de comer e beber. As saudades de um bom pão proporcionaram-me muito mais do que um bom pão!

 

1ª Foto DAQUI

3ª Foto DAQUI

4ª Foto DAQUI

5ª Foto DAQUI

6ª Foto DAQUI

 

 

25
Mar23

Bloomy - à Descoberta da "Bistronomie Végétale" na Cidade Cor-de-Rosa

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A bonita cidade cor-de-rosa recebeu-nos com chuva! Mas de forma acolhedora, e a chuva não nos impediu de tentar senti-la e descobri-la. Antecipávamos dificuldades na hora das refeições, não pela falta de interesse gastronómico, mas porque os meus dois acompanhantes eram veganos e, segundo constava, França nem sempre é um paraíso  para veganos. Mas desse ponto de vista, Toulouse não falhou de todo.

Um dos pontos altos foi, sem dúvida, um jantar no restaurante  Bloomy que diz oferecer Bistronomie Végétale. Um ambiente moderno e agradável, o riso aberto do empregado de mesa, o aspeto descontraído e calmo do chef Paul de Saint Blanquat, tudo isso contribuiu para um excelente jantar, mas o mais importante foi o que comemos. Pratos veganos, criativos, e sobretudo muito saborosos.

Na hora de pedir escolhemos uma das duas propostas de menu pré-definido -  o Menu Découverte (MD) - disseram-nos que era para duas pessoas e não o poderiam servir para três (imagino que as quantidades definidas dêem para duas pessoas e que pela características dos pratos, e por não virem empratados individualmente, não dê para aumentar). Achámos estranho, mas também achámos que era uma boa oportunidade de provar outros pratos e pedimos o menu Découverte e mais três pratos extra menu (EM).

 

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Les Sushis - Sashimi de pastèques, riz, perles d’algues, tuile de riz au wasabi, sauce miso (MD)

(sashimi de melancia, arroz, pérolas de algas, telha de arroz com wasabi, molho de miso)

 

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L' Artichaut - Artichaut frit, crème d’artichaut à la truffe, carottes en pickles, estragon frais (MD)

(alcachofra frita, creme de alcachofra com trufa, cenouras em pickles, estragão fresco)

 

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La Betterave - Pressé de betterave confite, crème yuzu & raifort, betterave à cru, coulis de betterave acidulé, amarante (MD)

(beterraba confitada prensada, creme de yuzu e rábano, beterraba crua, coulis de beterraba acidificado, amaranto)

 

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La Tarte Fine - Purée de céleri au poivre de Java, céleri rôti, poire en pickles et à cru, pickles de moutarde & jeunes pousses (MD)

(puré de aipo com pimenta de Java, aipo assado, pera em pickles e crua, pickles de mostarda e rebentos)

 

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Le Chou de Bruxelles - Choux frits, en pétales, brulés, pommes granny-smith à cru, gel de pomme, pickles de moutarde, ajo blanco & huile verte (MD)

(couves fritas, em pétalas, queimadas, maçã granny-smith crua, gel de maçã, pickles de mostarda, ajo blanco & óleo verde)

 

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Le Navet - En trompe l’œil comme des Saint-Jacques snackées, émulsion thaï, caviar végétal, crème iodée & fenouil à cru (EM)

(nabo em trompe l'oeil como vieiras salteadas, emulsão tailandesa, caviar vegetal, creme iodado & funcho)

 

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Les Rigatoni - Duxelles de champignons truffée, sauce mornay, champignons sautés, émulsion de noix & jus gras (EM)

(rigatoni - duxelles de cogumelos trufada, molho mornay, cogumelos salteados, emulsão de nozes e molho gordo)

 

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Le Salsifis - Salsifis braisé sur peau, terreau végétal, jus réglisse, bourrache & beurre blanc à la sauge (EM)

(salsifis estufado na sua pele, solo vegetal, molho de alcaçuz, borragem & beurre blanc de sálvia)

 

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La Mousse au Chocolat (MD)

 

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La Poire Pochée (MD)

 

Um conjunto grande de pratos, uns mais simples e outros mais espetaculares (como o salsifis que vinha numa campânula com fumo), mas todos muito diferentes visualmente e em termos de técnicas e sabores. As sobremesas do menu não eram as da carta, que me pareceram mais elaboradas, mas fizeram o seu papel para encerrar uma refeição tão rica. Uma excelente refeição e um preço também muito razoável, o menu era 38 euros por pessoa, com os três pratos extra ficou a 40 euros por pessoa (sem bebidas).

Interessante ver as diferentes aproximações à cozinha vegana, cada vez mais são evidentes as influências das cozinhas de cada país. Também o tipo de comida é variado, e a predominância de cada tipo está relacionada com as preferências dos consumidores em cada local. Se inicialmente aparecia muito associada a uma comida saudável, não é essa a tendência geral. No UK, por exemplo, é muito fast-food, muitos fritos, molhos com sabores fortes, muito hamburgers... Frequentemente é influenciada pela cozinha asiática, imagino que molhos com muito umami tornem os vegetais mais apetecíveis (para além da influência da cozinha asiática que se verifica em geral). Neste registo de cozinha criativa, nas experiências que tenho tido, há também um influência grande da personalidade e vivências dos seus criadores, como seria de esperar. É fascinante acompanhar esta área da cozinha em rápida evolução.

 

Bloomy - 38 Rue de la Colombette, Toulouse, França 

 

 

28
Fev23

Matando saudades dos nossos arrozes

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Estando longe, por vezes,  apercebemo-nos melhor das características da comida que nos causa conforto, do que faz parte das nossas memórias de sabores. Não estando as coisas tão disponíveis acabamos por sentir mais a falta e o que representam para nós.

Ao passar alguns períodos, mais ou menos longos, fora quando chego há coisas que me apetece imenso comer. Da última vez que regressei a Lisboa ia "desesperada" para comer arroz de cabidela. Não me saía da cabeça, dava comigo a ver menus de restaurantes para descobrir onde havia. Não era fácil... mas consegui. Num almoço no Pap' Açorda comi o tão desejado Arroz de Cabidela.

 

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Noutras ocasiões, ao escolher o que comer, tornava-se impossível resistir aos encantos dos arrozes...

 

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Arroz de Pato 

Restaurante O Frade - Mercado da Ribeira

 

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Arroz Cremoso de Tomate com Frutos do Mar

Restaurante BONO

 

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Borrego Assado com Arroz de Forno

Fogo Restaurante

 

Que bem me souberam!

Temos, de facto, uma diversidade de arrozes muito interessante! É mesmo um aspeto distintivo da nossa cozinha.

 

 

22
Fev23

Land - tem sido interessante acompanhar a evolução deste restaurante vegano

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A principal razão para ir ao Land foram as boas experiências anteriores e o facto da última refeição lá ter sido há muito, antes de um dado vírus ter causado um enorme transtorno nas nossas vidas. Entretanto tinha comido alguns pratos deles, notei uma evolução e queria perceber melhor. Em Janeiro foi divulgado que tinham sido incluídos na lista dos The Michelin Inspectors' Favourite New Restaurants o que me aguçou ainda mais o apetite e a vontade de lá voltar.

O Land ocupa agora um novo espaço, tal como anteriormente na belíssima Great Western Arcade em Birmingham, mas um espaço bastante mais agradável. A sala com cerca de 20 lugares tem a cozinha ao fundo onde os chefes Adrian Luck e Tony Cridland preparam os pratos de um menu 100% vegano com 8 momentos.

Ao longo de cerca de duas horas os pratos foram chegando à mesa. Não há propriamente uma distinção entre entradas e pratos principais, mas apenas entre 6 pratos salgados e 2 sobremesas.

 

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Socca Leeks Harissa

Na base uma panqueca de farinha de grão, típica da Provença, em França, e da Ligúria, em Itália. Coberta com alhos franceses estufados temperados com harissa, uma pasta de malaguetas, especiarias e ervas do Magrebe. Por cima uma emulsão de limão e arroz tufado.

 

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Celeriac Mushroom Chive

Puré de aipo-rábano, duxelles de cogumelos, por cima um crocante leve, penso que de batata, na base um óleo de cebolinho.

 

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Squash Masala Lentil

A abóbora assada e em chutney, texturas e sabores diferentes, as lentilhas crocantes, penso que fritas, um arroz de coco. Na mesa era deitada a masala, tinha preferido que esta tivesse um sabor menos forte. Num comentário que li, alguém dizia que era o melhor caril que alguma vez tinha comido. Perceções diferentes com base nas nossas culturas alimentares e experiências.

 

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Kohlrabi Yeast Onion

Couve rábano cortada em forma de tagliatelle e cozinhada, extremamente saborosa, um crocante de pão e cebolinhas em pickles.

 

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Potato Beetroot Salsa Verde

Terrina de batata, pickles de beterraba, crocantes de beterraba, molho verde de várias ervas, emulsão de miso.

 

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Cauliflower Gochujang Coriander

Couve-flor, sobre um emulsão de coentros, molho gochujang (um condimento coreano fermentado feito de malaguetas, soja e arroz glutinoso, que é picante, adocicado e com muito umami), um polme de tempura frito introduzia uma componente crocante.

Uma variedade grande de vegetais, tratados com várias técnicas diferentes. Pratos com sabores fortes, em que havia um equilíbrio entre os vários gostos e sabores, e com uma variedade de texturas. Todos muito diferentes, todos muito bons, alguns de certa forma surpreendentes.

 

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Apple Malt Black Garlic

Uma tartelete com uma massa finíssima, recheio de maçã e de um creme denso e saboroso,  por cima um creme de alho negro e um crocante de honeycomb.

 

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Chocolate Carrot Blood Orange

Um bolo denso de chocolate coberto com uma compota de cenoura e laranja sanguínea.

Sobremesas com sabores intensos, mas pouco doces. Muito boas! Normalmente este é um ponto fraco em muitos restaurantes, mas aqui estavam ao nível dos pratos.

 

Fui pela primeira vez a este restaurante em 2017, na altura chamava-se 1847, no ano seguinte fechou e reabriu com o nome de Land. Foi comprado pelos chefs Adrian Luck e Tony Cridland, que penso que já eram responsáveis pela cozinha do 1847. Entre 2017 e 2019 fui lá várias vezes.  Inicialmente era vegetariano, mas atualmente é exclusivamente vegano. Anteriormente servia à carta, atualmente são apenas menus completos, de 8 pratos ao jantar e ao almoço 5 ou 8. Tem sido interessante acompanhar a evolução.

Na cozinha vi apenas três pessoas. São os dois chefs que preparam todos os pratos de um menu longo, para uma sala que estava cheia. Não são comuns restaurantes veganos com este tipo de cozinha, com o nível de qualidade, complexidade e sofisticação destes. Sobretudo a um preço relativamente acessível.

Outro aspeto interessante, foi ter visto pela primeira vez (pelo menos que desse por isso) que o preço do mesmo menu varia consoante o dia da semana.  Terça a quinta ao jantar custa 45£/pessoa, à sexta e sábado 50£/pessoa. O pagamento é feito no ato da reserva e o dinheiro não é devolvido. Com aviso de 48 horas, a marcação pode ser transferida para outro dia, mas em caso algum há devolução do dinheiro. 

Nas regras das marcações é feito também um aviso que nunca tinha visto:

We encourage all diners to have an open mind and enjoy the experience as it is intended. We spend a lot of time developing dishes and therefore do not cater for dislikes or make substitutions.

Uma opção que para alguns será polémica, mas que compreendo perfeitamente.

 

 

Land - 30 Great Western Arcade, Colmore Row, Birmingham

 

Foto inicial DAQUI

 

06
Fev23

Lampreia - o luxo e o conforto

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Não me lembro de nenhum ano em que não tivesse comido, pelo menos uma vez, lampreia. Um ritual que partilho com algumas das minhas irmãs e sobrinhos. Por vezes em restaurantes de Lisboa, mas o ideal  mesmo é ir até ao Restaurante A Lena, no Apeadeiro da Barragem de Belver. Aconteceu este fim de semana.

Cresci a poucos quilómetros dali. A lampreia é para mim uma comida conforto, mas um conforto que é maior quando é cozinhada de forma idêntica à da que comia em casa dos meus Pais. Em restaurantes de Lisboa não é o mesmo... Além disso, este ano com a falta de lampreia, tornou-se um produto de luxo. Vi menus com doses a mais de 70 euros, com apenas 4 postas. Ali o preço é pouco mais de metade disso, pela refeição inteira - entrada, prato, sobremesa, bebidas e café. Para ajudar, o número de postas é cerca do dobro, comemos todos à vontade, e ainda trouxemos o que sobrou.

A lampreia vem de França, como aliás me disseram acontecer há já vários anos. Este ano nalguns rios em França a pesca está proibida, por questões de preservação da espécie. Tem que vir de outros rios, e vem menos.

Tinha ido ao restaurante A Lena há uns anos com alguns dos meus alunos, tinha escrito aqui sobre isso (parte I e parte II). Podia ter usado as mesmas fotos daquela refeição de há 6 anos, pois tudo estava igual. Gosto de aventura, mas também desta estabilidade e consistência.

Para terminar, uma excelente fatia de Tigelada, um doce que faz parte das minhas memórias gastronómicas.

 

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À saída estava a mostrar à minha sobrinha a mesa onde os meus Pais ficavam sempre, a dona apareceu e disse-lhe. Ela comentou: "Ah! Bem me parecia que as vossas caras me eram familiares. Sendo assim, vocês sabem mesmo o que é lampreia". 

Este ano não vou comer mais vezes, mas o ritual está cumprido e o gosto satisfeito. Estava tão boa! Para o ano lá estaremos de novo.

 

 

15
Jan23

Eu fui ao NOMA. Não sou rica. Não pretendia ser Rainha Por Um Dia.

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(o primeiro prato do meu jantar, há muito tempo, no NOMA)

 

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O NOMA vai fechar daqui a 2 anos, mas na última semana não se falou de outra coisa. Tudo tem um princípio e um fim, pode haver mil razões que não vou discutir.

Contudo, curiosamente, no dia em que soube que o NOMA ia fechar estava a ler o último livro do Heston Blumenthal, Is this a Cookbook?,  em que ele diz:

What was I chasing? Recognition? Affirmation? A sense of self-worth? I don't know. Yet. (I'm still a work-in-progress.) Increasingly, though, I became unsatisfied with the search of perfection. It seemed like a creative cul-de-sac - for me at least - and I realised I needed to change my relationship with food and cooking. Was I a chef, with all the baggage that entails, or, when it came down to it, was I simply a human who cooks because cooking is my way of connecting with other people and sharing my beliefs? A lot of those beliefs remained largely unexplored. Perhaps it was time to do something about that.

Lembrei-me do NOMA. Pensei:  Quem sabe é apenas a altura de mudarem a relação com a comida e a cozinha. É humano que o seja.

Mas as razões só eles as poderão dizer. Se quiserem. Não ia escrever nada sobre este assunto, não tinha nada para dizer. Li algumas coisas, especulações que poderão até corresponder a parte da realidade, mas são bem mais simplistas, suponho que as motivações sejam complexas e com várias camadas.

Porque é que escrevi afinal? Porque o artigo do Miguel Esteves Cardoso no último Fugas - Umas palavrinhas enlutadas por ocasião da morte do Noma - me deixou desconfortável. Nem vou procurar muitas palavras novas... a sensação foi semelhante à que já tive, em tempos, devido a outros comentários.

Fiquei chocada e triste ao ler o artigo do Miguel Esteve Cardoso, não por causa das suas preferências gastronómicas, pois cada um está no direito de gostar do que gosta e do que o faz feliz, e de escolher os restaurantes que quer.

Agora dizer:

Restaurantes como o Noma são essencialmente saloios. Alimentam – a palavra está singularmente mal empregada – o sonho de ser Rainha Por Um Dia.

Parece-me uma atitude profundamente primária. Não é sério, revela uma falta de reflexão sobre a gastronomia em geral e as várias aproximações possíveis.

Não tem também sentido dizer:

Um bom restaurante é aquele onde se quer almoçar todos os dias.

Um restaurante onde se quer almoçar todos os dias, pode (e deve) ser ótimo, mas o NOMA é outra coisa. É comparar alhos com bugalhos.

Já agora, se o Miguel Esteves Cardoso diz que nunca foi ao NOMA, como afirma com tanta certeza que outros  Não foram mais vezes ao Noma porque a própria comida não se aguenta mais do que uma vez ou outra. ?   

É verdade que:

Redzepi cobrava centenas de euros aos clientes, mas dependia do trabalho de estagiários que trabalhavam de borla.

Já aqui tenho abordado este assunto diversas vezes. Mas muitos o fazem, quase todos os restaurantes a este nível o fazem, ou fizeram, não é uma característica do NOMA. Merece discussão, que tem havido, e felizmente esta situação começa a mudar.

A relação de cada um de nós com o que come, as expetativas que tem, o que valoriza... são diferentes. Válidos em todos os casos. Também por isso, este tipo de classificação do NOMA e dos clientes do NOMA não é admissível e é demagógico.

Também o é a forma como Miguel Esteves Cardoso discute o preço de uma refeição no NOMA. Claro que é bem mais do que se paga no restaurante onde se almoça todos os dias. Mas o que nos oferecem também é bem diferente, com várias componentes para além da que oferece o restaurante onde se almoça todos os dias. Só vai quem quer.

Eu não sou rica e fui ao NOMA. Não pretendia ser rainha por um dia. Queria conhecer um trabalho que tanto influenciou a gastronomia a nível mundial, perceber, poder falar com conhecimento de causa. Tudo isto até era mais importante do que o prazer físico, a importância de comer uma boa refeição. Mas esse também fez parte da minha experiência, gostei muito do que comi, mais (porque o que sentimos é determinado por mais do que o que está no prato) gostei da experiência global. Saí com vontade de voltar, e se fosse mais perto seguramente teria voltado. 

Para terminar, mais uma referência a Heston Blumenthal (do seu último livro) e uma questão.

Increasingly, I've come to see cooking in terms of quantum perpective - which, for me, at its most basic, means everything we do can be viewed in an infinite number of ways: how we experience it is determined by what perspective we choose.

As perspectivas são infinitas, será que tem algum significado classificar as dos outros (com base na nossa)? 

 

 

23
Dez22

Um Calendário do Advento e muito Divertimento

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O Natal está quase aí. Houve alturas em que para mim tinha uma magia especial... Agora por vezes apetecia-me senti-la, mas... nem sempre consigo.

Para ajudar a criar alguma expetativa neste período natalício, este ano resolvi comprar um calendário do advento para mim. Não, não é daqueles habituais com uns chocolatinhos. Este permite-me novas experiências e aprender mais.

Não bebia café, mas durante o confinamento descobri o café de especialidade. Desde aí continuei a experimentar novos cafés e a ampliar cada vez mais as experiências. Até fiz um curso para aprender a fazer o café em casa como deve ser. 

 

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Comparei lado a lado o mesmo café feito com uma French Press, uma Aeropress e uma V60. O último método é o meu preferido. Alterno cafés de diferentes marcas, e abrir um novo pacote é sempre uma descoberta. Quando vi este calendário do advento, uma caixa com 25 pacotes com 20 g de café cada, todos diferentes, achei que era mesmo o que eu precisava para adicionar uma camada extra de magia ao Natal.

 

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Cafés de especialidade de 7 países diferentes, 4 edições limitadas, 14 micro-lotes. Os dois últimos serão estes, e dizem que o de 25 é muito especial. 

 

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Cada um tem informação sobre os seus produtores, o método de produção e notas de prova.

 

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Comprei duas caixas, uma para mim, outra para uma das minhas filhas que me tem acompanhado nesta descoberta do mundo do café. Trocamos sempre impressões sobre o café do dia. 

Tem sido um divertimento muito formativo. Experimentar 25 cafés diferentes em 25 dias é fantástico! Uma experiência única, que de outra forma seria impossível.

 

Desejo-vos um Bom Natal!

 

 

19
Dez22

Trindade - muito há a refletir sobre a nova reencarnação desta antiga cervejaria

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Há umas semanas li que, depois de muito tempo fechada para obras de remodelação, a Trindade tinha aberto. Há uns dias estava na Baixa à hora de almoço e decidi ir à Trindade.

Houve um período da minha vida em que ali ia muito frequentemente, fosse para almoçar ou jantar, ou apenas para umas cervejas com umas batatas fritas, uns croquetes ou uns rissóis. Deixei de ir regularmente, mas durante muitos anos continuei a ir ocasionalmente. Há uns anos que não ia e resolvi voltar àquele lindíssimo espaço.

Comecei por notar que o espaço da sala estava organizado de uma forma diferente, mas os azulejos ainda mais bonitos.

 

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Antes de me sentar, até mesmo antes de entrar, sabia o que ia comer. Tinha decidido que ia reviver velhos tempos e hábitos. Nem precisaria do menu, mas dei uma vista de olhos, aos pratos e às bebidas. Nesta altura aconteceu o 1º contratempo, tinha planeado beber uma imperial mista, como habitualmente ali fazia. Não vi na lista cerveja Sagres preta. Olhei para as torneiras das cervejas a copo. Não, não estava lá... Se calhar devia ter pedido uma imperial "normal", mas gosto de cervejas IPA, pedi a Profana. Achei graça ao nome, senti-me profana, por ali estar a beber uma cerveja de garrafa, coisa que nunca tinha feito. A garrafa era bonita, a cerveja agradável. Mas não era o mesmo...

Para entrada pedi um croquete. Ele chegou e quando o ia comer apeteceu-me, como habitualmente fazia, pôr-lhe umas gotas de mostarda. Olhei para a mesa, não havia mostarda - 2º contratempo. Não havia no momento nenhum empregado de mesa por ali e fui comendo o croquete. Cremoso e saboroso, soube-me bem. Mas sem mostarda, não era o mesmo... 

 

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Com o bife chegaram mais contratempos. Costumava temperar as batatas com sal, pimenta e um fio de mostarda. Nada sobre a mesa... não exagero se disser que me senti um pouco peixe fora de água, desconfortável, faltavam ali coisas habituais e importantes. Desta vez pedi sal e mostarda. Veio um moinho de sal de madeira. Tudo bem, não era o que esperava, mas era coerente com as pretensões do novo ambiente. Quando a mostarda chegou... 3º contratempo (dois já relacionados com a mostarda). Em vez de vir num frasco que permitisse dosear, veio uma tacinha com mostarda. Nada para a tirar, tirei com a minha faca. Não gostei, não permitia pôr um fio de mostarda sobre as batatas, de forma a que cada uma não ficasse a saber muito a mostarda, mas quase todas tivessem uma nota de mostarda. Achei um desperdício (coisa que nunca caiu bem, mas nos tempos atuais ainda menos). Não usei nem um quarto da mostarda que trouxeram e o destino do resto foi o lixo. Imagino que os frascos de plástico amarelo não fossem coerentes com a estética atual, mas arranjem outros que desempenhem a função... 

 

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Antes de começar a comer o bife, e depois de temperar as batatas, peguei numas com a mão para acompanhar uns golos da cerveja. Quando chegaram à boca, nem foi surpresa, pois já o tinha sentido, as batatas estavam murchas - 4º contratempo. Comiam-se, mas eram apenas umas batatas fritas sofríveis.

Iria o bife salvar a situação? Era bom era, mas não salvou. Há tanto tempo que não ia ali, apetecia-me um bife bom, pedi um bife de lombo mal passado. Estava mais para o médio, a tender para bem passado. Quase parecia que tinha sido batido, embora admita que não foi, mas algumas partes tinham um corte horizontal a meio que interferia com a textura. As memórias que temos podem ficar desfocadas com o tempo... mas o molho pareceu-me diferente, e para pior. Era levemente adocicado, felizmente a mostarda e o sal ajudaram a salvar um pouco a situação. Não tinha pão, não molhei pão, e a parte final do bife foi comida já sem molho, pois já tinha acabado. Era preciso pouparem no molho? Ou seja, o bife foi o 5º contratempo, e o molho o 6º contratempo.

Perguntaram se queria sobremesa, claro que tinha pensado num daqueles pudins flan individuais, tão característicos das cervejarias, mas não havia - 7º contratempo. Havia várias sobremesas, mais coerentes com as pretensões do espaço, mas não com as minhas.

Pedi a conta - 8º contratempo. Um bife com batatas fritas sofrível, uma cerveja e um croquete custaram 35,70 euros (já com a gorjeta sugerida na conta - esta não chegou a ser um contratempo, mas hei-de voltar a este assunto noutra altura). Achei caro, muito caro para aquilo que me ofereceram! Sei que o Alexandre Silva é consultor, não sei qual foi o seu papel, talvez na introdução de novos pratos e sobremesas, que não provei.

A Trindade perdeu aquele ambiente boémio, está agora mais séria e com outras pretensões. Talvez agrade a turistas e a quem nunca a conheceu antes, mas acredito que quem a conheceu saia com as expetativas defraudadas, como me aconteceu. Aliás, depois de sair fui ler alguns comentários de clientes e vários se queixam de alguns dos pontos que referi.

Como dizia há tempos, as expetativas por vezes são lixadas. Querer reviver o passado, também pode dar mau resultado, os tempos são outros, e nós somos outros. Mas, apesar disso, acho que muito há para refletir sobre esta nova vida da Trindade. Não voltarei nos tempos mais próximos... E tenho pena!

 

Cervejaria da Trindade  - R. Nova da Trindade 20 C, Lisboa

 

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