Sardinhas em Sheffield
Há exatamente 34 anos estava a fazer um pós-doutoramento na Universidade de Leeds, estava integrada no projeto "Design Racional de Moléculas Envolvidas em Situações de Reconhecimento Molecular", que estava a arrancar. O projeto era liderado por uma investigadora que vivia em Sheffield. No ano em que trabalhei no projeto, e nos anos que se seguiram, em que mantive alguma colaboração, Sheffield era uma cidade frequentemente referida. Nunca tinha ido a Sheffield, durante o ano de pós-doutoramento não fui lá (apesar da viagem de comboio durar menos de 1 hora), posteriormente também nunca visitei a cidade. Não tinha nenhuma imagem de Sheffield. Recentemente, andava a precisar de uns dias de descanso, olhei para o mapa do UK para escolher onde poderia ir passar um fim de semana, e Sheffield foi a escolha. Uma cidade não demasiado longe, não demasiado grande ou pequena, hotéis com preços razoáveis, e alguns restaurantes que poderiam ser interessantes.
Depois de um passeio por Kelham Island, outrora a zona de produção da indústria de cutelaria e aço de Sheffield, a que agora zonas residenciais, pubs, cafés, lojas e restaurantes independentes deram uma nova vida, fui almoçar a um dos restaurantes que me tinha parecido interessante, o Native, um restaurante cuja oferta se centra em peixe e mariscos. Tinha lido algumas coisas sobre o restaurante e achei interessante que fosse de uma empresa que comercializa peixe, a J H Mann Fishmongers, uma empresa fundada em 1921 e que durante quase 100 anos pertenceu à mesma família. Christian Szurko, chefe de cozinha e dono atual da empresa, trabalhava em Sheffiled e, em 2005, decidiu ficar com a empresa e empenhar-se em continuar a manter o nível de qualidade e excelência dos produtos. Depois da pandemia decidiram que a empresa, para além do comércio de peixe, tivesse também um restaurante, e em 2021 o Native abriu tendo com linha de orientação o seguinte: “Os produtos do mar devem ser frescos, honestos e tão dinâmicos quanto as águas de onde vêm”.
Uma decoração atraente, com um cozinha aberta, vestígios de um ambiente industrial com paredes de tijolos à vista, aço exposto e tetos altos, complementados com um conjunto de quadro com cores fortes e móveis de madeira. Há um menu regular com propostas mais ou menos clássicas, e outro com uma oferta que vai variando e é apresentado num quadro, com pratos mais criativos.
No quadro apareciam umas Grilled Sardines - Puntarelle, Anchovy, Chilli and Preserved Lemons, associo sempre sardinhas a uma certa nostalgia, e outras formas de as apresentar deixam-me sempre curiosa. Não fazia a menor ideia do que era puntarelle, uma pesquisa rápida e fiquei a saber que era um tipo de chicória. Mais, que era usada numa salada tradicional italiana com anchova, alho, azeite, vinagre e sal, suspeitei que de certa forma esta poderia ter inspirado o acompanhamento das sardinhas. Estava decidido! Apetecia-me o sabor a mar das ostras, e não resisti à focaccia com óleo de lagosta e óleo de algas.
Produtos frescos e muito bem tratados. Interessante a foccacia com os dois óleos com aromas marinhos. Mas o melhor foram as sardinha. O conforto do seu sabor característico, um excelente ponto de cozedura que as deixava com uma textura muito agradável, o exotismo do tempero, e um acompanhamento fresco e saboroso, resultaram num excelente prato.
Apeteceu-me experimentar outra coisa e a escolha recaiu no Mussel Crumpet - Mussels, Garlic Butter, Monks Beard.
Um prato muito guloso, e um pouco mais pesado também, com o crumpet bem ensopado com a manteiga de alho. A monk's beard (Salsola Soda) uma planta halófita, um pouco crocante e com um sabor herbáceo, semelhante a espinafre, e levemente salgado, contrastava com a riqueza do prato e complementava-o muito bem.
Seguiu-se uma tarde no centro da cidade.
No fim do dia já tinha uma imagem, e até sabores, de Sheffield.