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07
Mai16

Caldo verde e a magia da transformação da rústica couve em finíssimos fios

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Há dias passei por uma loja e chamaram-me a atenção, numa montra um pouco desarrumada, estas máquinas. E particularmente as duas máquinas de cortar couve para caldo verde.

 

Sempre achei fascinante ver cortar couve para caldo verde. A rústica couve portuguesa, umas mãos com as marcas de uma vida de muito trabalho, uma faca bem gasta pelo uso, e o resultado final eram uns finíssimos fios de couve. Ao ver estas máquinas fiquei parada em frente à montra a pensar que, tal como eu, a maior parte das pessoas já não sabe cortar couve para caldo verde. Compramos já cortada ou comemos a sopa num restaurante. Tanto num caso como noutro possivelmente a couve é cortada numa máquina como estas. Portanto sem a magia da couve cortada à mão, em fios finíssimos, que penso que só se pode ver nos mercados, que cada vez menos frequentamos.

 

Apeteceu-me então saber um pouco mais sobre o caldo verde. Encontrei um texto do Virgílio Gomes sobre sopas portuguesas em que, relativamente ao caldo verde, diz:

 

Deixei para o fim, propositadamente o caldo mais famoso de Portugal e quase um ícone das nossas cozinhas. Porque se chama caldo ao Caldo Verde? Será que se começou a confecionar apenas após o aparecimento da batata? Ou seria anteriormente confecionado com castanhas? Parece indiscutível que tenha nascido no Minho. Todos os manuais de cozinha portuguesa apresentam a sua receita. Mas vamos encontrar várias versões, variando estas na forma de fazer o caldo de base, o tempo de cozedura das couves, o pão que acompanha e o tipo de chouriço utilizado. Não querendo reproduzir receitas já publicadas, refiro que o inventário guloso e sábio de Maria de Lourdes Modesto apresenta apenas receitas do Minho e Alto Douro, e da Beira Alta. Permito-me descrever a forma como era confecionado em minha casa transmontana. Colocava-se uma panela ao lume com água. Se era inverno e havia lareira com pote de três pés, com água permanente e ossos do presunto, usava-se essa água que já tinha tempero. Depois colocava-se um pedaço de toucinho, batatas cortadas aos cubos, cebolas às rodelas e alguns dentes de alho. Deixava-se cozer tudo muito bem. Depois reduzia-se este caldo a creme com tudo muito bem passado, e deixava-se próximo do lume. À parte cortava-se a couve muito fina em “caldo verde”. Preparava-se uma terrina colocando as couves no fundo, colocava-se uma rodela do melhor chouriço por cada conviva, e então colocava-se o creme de batata que estava ao lume. Mexia-se um pouco para misturar as couves. Estas não chegavam a cozer e o caldo ficava verde. Depois desta operação regava-se com azeite cru, do melhor. Ia à mesa para servir, acompanhado de fatias de pão de mistura ou pão de centeio.

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Nunca tinha lido nada sobre fazer o caldo verde desta forma, em que não se chegavam a cozer as couves. Em todas as receitas que tinha visto estas coziam no caldo e, em épocas em que a couve está mais rija, escaldava-se inclusivamente a couve antes de a cozer no caldo. Presumo que para fazer o caldo verde como o Virgilio refere a couve deveria estar macia. Achei muito interessante.

 

Ao ler a receita lembrei-me de um restaurante asiático em Londres onde vi fazer a massa da sopa que comi, estava um cozinheiro na montra a fazê-la.

 

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E de repente sirgiu uma enorme vontade de ir a um restaurante, em que o caldo verde fosse feito como o Virgílio descreve que era feito na sua casa, e em que a couve fosse cortada na altura, e que a pudesse ver cortar, e desta forma associar à sopa a magia que é a transformação da rústica couve portuguesa, por umas mãos com as marcas de uma vida de muito trabalho e uma faca bem gasta pelo uso, nuns finíssimos fios de couve.

 

 

2ª foto DAQUI

3ª foto DAQUI

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