Menus temáticos (memórias, conceitos ou destinos) de seis pratos que mudam de seis em seis semanas. Era assim que era descrita a oferta do Six by Nico na muita informação que diariamente comecei a receber. Mais do que isso, tinha aberto um em Birmingham, de fácil acesso para mim, no final de Novembro de 2023. As fotos dos pratos eram atraentes, e o preço impressionante - 39 libras, com menu de vinhos a emparelhar por 30 libras (450 ml de vinho). Dava que pensar...
O Six by Nico é uma cadeia de restaurantes, neste momento com 14 restaurantes em 10 cidades do Reino Unido. Foi fundada em 2017 por Nico Simeone, em Glasgow, a sua cidade natal. Tinha trabalhado em vários restaurantes, um com uma estrela Michelin que oferecia menus de degustação, e decidiu abrir um restaurante em que democratizaria esse formato de refeição. Normalmente os menus de degustação estão associados a restaurante de fine dining, que são caros, e a maioria da pessoas não tem oportunidade de ter essa experiência. O objetivo de N. Simeone não era dar às pessoas uma experiência de fine dining, com o que tudo isso implica, mas menus de degustação a um preço acessível a muitas bolsas. Chamaram-lhe louco, mas o conceito teve muito sucesso.
De repente vários blogs e jornais locais começaram a falar do restaurante de Birmingham. Ficou bem claro que foram convidados para uma refeição no período de soft opening. Os comentários eram em geral positivos, os dos clientes também, com uma ou outra exceção, como uma má crítica num jornal da cidade, mas nem batia muito na comida, a irritação era mais com os empregados que, num dos primeiros dia de um menu, ainda não sabiam bem descrever os pratos.
O segundo menu do restaurante de Birmingham é inspirado na Alice no País das Maravilhas, a divulgação era bem feita, e decidi marcar. No processo de reserva fui informada de que a mesa seria minha durante 2 horas, se não quisesse ter o tempo limitado deveria marcar às 9 da noite, ou depois disso. Duas horas pareceu-me razoável. Não ia com grandes expetativas... Diz-se que se tem o que se paga...
Entrei, para uma almoço tardio num dia de semana, num restaurante numa zona nobre do centro da cidade, com uma decoração sóbria e elegante. Não estava cheio, mas bem composto, mas quando saí penso que as mesas estavam quase todas ocupadas.
Mad Hatters Tea Party
Muhroom Tea / Smoked Bacon Jam / Truffle Parmesan Royale / Pickled Walnuts & Keen' Cheddar Scone
Sobre a mesa o menu impresso (em papel comestível), explicaram-me que o preço incluía o menu base (os pratos que indico), mas que este poderia ser complementado com algumas entradas ou adição de mais elementos ao prato de carne. Escolhi apenas o menu base e um copo de vinho branco.
The White Rabbit
Rabbit, Chicken & Date Ballotine / Beef Fat Roasted Carrot / Tarragon Pesto / Rabbit Bolognese / Carrot Ketchup
Meia dúzia de cozinheiros, numa cozinha que dá para a sala iam preparando os pratos que saíam a um bom ritmo. Não esperei muito entre cada prato, mas também não senti que fosse apressada. O ritmo era adequado, em média os pratos foram chegando de 15 em 15 minutos.
Paint the Rose Red
Goats Cheese Mousseline / Baby Beetroot / Garden Radish / Kalamata Olive Soil / Red Apple Caramel
Um serviço simpático e eficiente, mas sem grandes salamaleques. Apesar de termos o menu com descrição dos pratos sobre a mesa, cada um era explicado quando chegava. Dispensava terem-me perguntado em cada prato e ainda o chefe de sala, pelo meio, se tudo estava bem e tinha gostado... menos vezes era melhor.
Eat Me, Drink Me
Roasted Black Pollock / Miso Glaze / Bonito Emulsion / White Turnip Puree / Pickled Tokyo Turnip / Dashi Broth
Cerca de metade dos pratos eram frios, o que facilitava manter o ritmo. Havia muito pouca cozinha no momento, se é que havia alguma...
Off With Its Head
Pork Belly / Choucroute / Apple Gel / Pig Head Croquete / Cauliflower & Sauce Charcuterie
Esteticamente os pratos eram bonitos. A realidade, apesar de ser menos atraente que as fotos de divulgação (mas isso acontece quase sempre), era bastante satisfatória. Os ingredientes, embora não fossem premium, ou muito caros, eram de boa qualidade, e os pratos saborosos. Acredito que uma experiência nova para muitos dos clientes.
Queen of Hearts
WHite Chocolate Mousse / Red Velvet Cake / Raspberries / Pecan Britlle
E no final... superou as expetativas que tinha quando entrei. O que comi era bom e, tendo em conta o que custou era ótimo. A quantidade adequada. O que me ofereceram valeu bem as 60 libras (incluindo já 12,5% de gratificação) que paguei.
É verdade que pequenos detalhes podiam melhorar a experiência. Por exemplo, no Mad Hatters Tea Party, o primeiro prato, a magia seria maior se o (excelente) caldo de cogumelos viesse numa chávena de porcelana, e um scone quente faria subir o nível do prato. Mas temos o que pagamos... e as coisas têm que ser planeadas com um controle grande de tempos e custos. Melhores pontos de cozedura do peixe e da carne também era desejáveis, mas é um restaurante de massas, em que outros pontos de cozedura seriam mais difíceis de controlar e possivelmente não agradariam a muitos clientes.
É um conceito de restaurante inovador e bem implementado. Analisando o que vi e li, há outros aspetos que permitem oferecer esta experiência por um preço tão baixo. Um deles, o volume de vendas. Os restaurantes estão abertos 6 dias por semana, três deles só para jantar entre as 4 h 30 m e as 11 h e 45 m, nos outros três dias entre as 12 h e as 11 h e 45 m, sempre com slots (rigorosos) de 2 horas por mesa. Isto permite uma grande rotatividade e servir um número grande de clientes. Nem todos os 14 restaurantes têm o mesmo menu, mas vários deles têm, tal permite eventualmente negociar melhor o preço dos produtos, e alguma economia de escala. Os vários elementos dos pratos são pré preparados, e possivelmente (penso eu) até nalguma cozinha central que serve vários restaurantes. Há depois um planeamento rigoroso dos menus, para que as preparações de última hora e empratamentos possam ser feito de forma a manter o ritmos adequado e tendo em conta o alto volume de clientes.
O custo da experiência permite que esta seja repetida mais vezes do que em restaurantes mais caros. O facto dos menus serem alterado de seis em seis semanas, faz com que se se perde a oportunidade, esta dificilmente surja de novo, e portanto com que as pessoas não atrasem demais as marcações se têm interesse em experimentar. Faz também com que cada menu seja uma experiência diferente, e quem gostou fique com vontade de voltar para outras experiências.
Cada vez há mais pessoas com opções alimentares mais restritivas, e um restaurante como este não pode prescindir delas como clientes. Assim, em paralelo com o menu "normal", há uma versão do menu vegetariana, que pode ser adaptada a vegana se isso for pedido quando da marcação. Adaptam-se também a outras restrições alimentares, desde que previamente informados.
Ninguém promete fine dining, isso nunca é referido no site nem na publicidade do restaurante. Mas lendo comentários de quem lá vai muita vezes é referido ser uma (frequentemente a primeira) experiência de fine dining. Será que experiências destas podem até motivar alguns clientes a frequentarem restaurantes num patamar superior em termos de ambiente, serviço e cozinha? Acredito que sim. Algumas pessoas sentem-se intimidadas com o que uma refeição num restaurante de fine dining envolve, penso que esta experiência introdutória intermédia possa ajudar a ultrapassar algumas barreiras e despertar a curiosidade.